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31 de Maio de 2004

Clipping - Filhos do coração

O jornal Zero Hora, em sua edição de 16 de maio, na página 36, estampou interessante matéria sob o título "Exame de DNA comprova troca de crianças ocorrida há 12 anos". No corpo da notícia é informado que, apesar de provada a troca de crianças na maternidade, "as duas mães afirmaram que não têm interesse em destrocar as meninas porque elas já são quase adolescentes e têm vontade própria". Diante do drama vivenciado por essas famílias, cabe indagar: o que deve ser mais valorado na relação paterno-filial: a biologia ou o afeto?

Desde o final do século 20, a dinâmica das relações familiares vem conduzindo os especialistas na matéria a admitir a desbiologização da paternidade. Sob esse enfoque, a verdadeira paternidade (ou parentalidade, pois abrange também a relação materno-filial, como é óbvio) é a que se funda no afeto (socioafetiva ou sociológica), podendo ou não coincidir com o vínculo genético.

A importância do reconhecimento de que as relações afetivas devem preponderar, no âmbito da família, sobre qualquer outro valor, evidencia-se quando surgem litígios em torno da guarda das crianças. De um lado, aparecem os pais biológicos, e de outro, os que cuidaram e deram amor ao pequeno ao longo de um largo período, no qual sólidos vínculos entre eles são criados. Nesses casos, em nome do melhor interesse da criança, a preservação da relação já consolidada será, de regra, a preocupação maior do julgador.
Muito antes da cogitação dos juristas, a sabedoria popular (conhecida como "a voz de Deus") já admitia essas verdades, referindo-se a tais filhos como "filhos do coração". E é justamente o que se constata no caso noticiado, em que ambas as mães manifestam sua intenção de não destrocar as filhas, com as quais, respectivamente, já consolidaram sólida relação afetiva, resultado não da biologia, mas da convivência e do cuidado diário.

Fonte: Jornal Zero Hora
Autor: Luiz Felipe Brasil Santos/ Desembargador do TJRS

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