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21 de Julho de 2016

Jornal da Cidade - Bauru tem sua primeira criança a conseguir sobrenomes de duas mães

Rayssa Preto Rosa Barbosa. Há seis dias, uma criança de 3 anos passou a se chamar assim, com os sobrenomes de suas duas mães. É a primeira vez que Bauru realiza o registro por filiação socioafetiva e a cidade foi além: o procedimento durou só 15 dias, sem que o casal precisasse recorrer à esfera judicial.

Mãe biológica da menina, a atendente Lithiene Aline Barbosa, de 25 anos, não se aguenta de felicidade. Ela tem um relacionamento com a auxiliar de cozinha Thais Preto Godoi, de 22, há seis anos e a escolha de ter uma filha partiu das duas. “Quando engravidei, o objetivo era o de recorrer à Justiça depois”, narra.

Como a menina nasceu prematuramente, as mães se preocuparam apenas com a saúde do bebê. Quando Rayssa conseguiu se recuperar, as duas começaram a se movimentar. No Cartório do 2.º Subdistrito de Bauru, Lithiene foi informada de que haveria a chance de conseguir o feito sem recorrer à Justiça.

É o que reforça o oficial do órgão, Alexandre Mateus de Oliveira. Segundo ele, uma das mães da menina o procurou no dia 30 de junho deste ano. “Eu entendi que seria possível conseguir os dois sobrenomes administrativamente e autorizei o prosseguimento do pedido ao Ministério Público (MP) e ao juiz corregedor permanente, Gilmar Garmes”, narra.

Fora da Justiça

Oliveira explica que a decisão do magistrado não teve cunho judicial, porque não houve participação de advogados e nem qualquer custo às partes. “Só precisei abrir vistas ao MP e esperar a decisão do juiz”, conta. Dito e feito. A certidão de Rayssa ficou pronta no último dia 15, duas semanas depois do requerimento.

Segundo Oliveira, a partir do momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união homoafetiva, o ordenamento jurídico tem de se adaptar. “Em 2014, a Corregedoria Geral da Justiça do Estado, na Capital, autorizou a filiação socioafetiva em caso semelhante ao de Bauru”.

Essa, inclusive, foi uma das argumentações utilizadas pelo oficial. “Isso adicionado a um fato novo: o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) autorizou, no começo do ano, o registro de nascidos por reprodução assistida, independentemente de terem dois pais, duas mães ou simplesmente pai e mãe”.

Com a divulgação do caso, o oficial do cartório espera que a situação passe por normatização, fato que tornará o procedimento muito mais rápido. “Não precisaria passar pelo MP e juiz e a certidão ficaria pronta na hora ou dentro de, no máximo, cinco dias, o que já ocorre com casais heterossexuais. É questão de igualdade”.

‘Família é amor’

Lithiene Aline Barbosa conta que Rayssa foi amada por ela e sua companheira desde o início da gestação. “Ela nasceu e cresceu conosco e sabe que tem duas mães. Família é amor, carinho, afeto, dedicação, não orientação sexual”, argumenta a jovem. Agora, a pequena não vê a hora de retornar das férias para contar a novidade à professora. “Ela fica repetindo o novo nome todo o momento”, diz.

Para juiz, conceitos ‘antigos’ têm de ser revistos

Para o juiz corregedor permanente do Cartório do 2.º Subdistrito de Bauru, Gilmar Garmes, “impedir o reconhecimento da filiação socioafetiva na via administrativa implicaria inegável afronta à vedação da discriminação da filiação, além de representar medida de desjudicialização, porque transfere a órgão não jurisdicional questão que prescinde da manifestação do Estado-Juiz”.

Além disso, ele defendeu, em sua decisão, que “o reconhecimento da filiação socioafetiva é modalidade de parentesco ainda precoce em nosso ordenamento jurídico e em nossa jurisprudência pátria, de modo que precisa ser interpretado à luz dos novos princípios informadores do direito de família, abandonando-se conceitos antigos, arraigados em nossa cultura e já incompatíveis com a realidade”.

Análise deve ser realizada caso a caso

O oficial do Cartório do 2.º Subdistrito de Bauru, Alexandre Mateus de Oliveira, afirma que, desde 2010, o modelo das certidões de nascimento mudou. “Antes, o texto era livre e, normalmente, se usava ‘pai’ e ‘mãe’. Agora, existe um padrão, em que os campos necessários têm de ser preenchidos e um deles consta apenas ‘filiação’”, revela.

Oliveira destaca que a filiação socioafetiva só foi possível para as duas mães de Bauru, porque havia apenas um nome registrado na primeira certidão. “Se tivesse o nome da mãe e o do pai, o procedimento seria judicial. Outro ponto importante é que, como ainda não há normatização sobre o assunto, cada caso precisa ser analisado”, finaliza.

Fonte: jcnet

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