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28 de Setembro de 2016

CGJ-SP divulga parecer contrário à acumulação de atribuições em novas Comarcas paulistas

DICOGE

DICOGE 1.1

PROCESSO Nº 2016/165043 – SÃO PAULO/SP – OFICIAL DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E TABELIÃO DE NOTAS DE HORTOLÂNDIA E OUTROS 

Para amplo conhecimento, publicam-se os rr. parecer e decisão que seguem, elaborados nos autos em epígrafe:

PARECER Nº 198/2016-E

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de requerimento feito por Tabeliães de Notas de diversos Municípios do Estado de São Paulo que, por força da Lei Complementar Estadual n. 1.274/2015, foram elevados à categoria de Comarcas.

Os requerentes afirmam que, devido a essa elevação, fazem jus à acumulação da especialidade de protestos de letras e títulos em suas serventias. Aduzem, como fundamento de sua pretensão, em resumo, os seguintes pontos: o Provimento CSM 747/2000 continua em vigor, pois a ação direta de inconstitucionalidade n. 2415/SP foi julgada improcedente e não se pode levar em consideração, para a verificação da inconstitucionalidade do ato, aquilo que restou discutido na fundamentação do acórdão; ainda existindo no mundo jurídico, o Provimento CSM 747/2000 alberga as situações jurídicas dos interessados, que detinham, desde a sua edição, uma titularidade potencial à acumulação da função de protestos. A titularidade passou de potencial a atual quando os Municípios foram elevados à categoria de comarcas; os interessados, baseados no princípio da confiança, detém a legítima expectativa de que poderão acumular a função; a não acumulação feriria o princípio da isonomia, pois os interessados deixariam de exercer uma função que outros tabeliães de comarcas já existentes exercem; a acumulação não implica criação de novas delegações, mas reestruturação, conforme previsão do art. 2º, III, do Provimento 747.

É o relatório.

Passo a opinar.

Com a edição da Lei Complementar Estadual n. 1.274/2015, diversos Municípios foram elevados à categoria de Comarcas. Com a reestruturação territorial, a questão que se coloca é: pode o Tribunal de Justiça, por ato administrativo, outorgar aos Tabeliães de Notas dessas novas Comarcas o exercício da especialidade de protestos de letras e títulos, ou é necessária lei – em sentido formal – que o faça?

Vou além: embora não seja objeto da consulta, a mesma questão pode ser feita em relação à especialidade de registro de imóveis. Ambas, protestos e registro de imóveis, regem-se pela territorialidade. Criada nova Comarca, passa a haver nova base territorial. Surge, com isso, a mesma indagação: ambas as especialidades podem ser outorgadas, automaticamente, a serventias já existentes nessas novas comarcas, independentemente de lei específica que o faça?

A resposta me parece negativa. 

Como já disse várias vezes, a leitura do Acórdão da ADIN 2.415/SP deve ser feita de maneira sistemática, de forma bastante atenta. Cuidou-se de ação de inconstitucionalidade que teve por objeto os Provimentos CSM 747/2000 e 750/2001 (este apenas complementou o primeiro), que dispuseram, à época, sobre a reorganização das delegações de registros e de notas do interior do Estado de São Paulo, mediante a acumulação e desacumulação de serviços, extinção e criação de unidades. Reestruturouse, enfim, todo o conjunto de delegações.

Ao final do voto, ainda que o resultado tenha sido de improcedência, o Ministro Cezar Peluso foi enfático: “Também peço vênia ao Ministro Marco Aurélio - se me engano, Vossas Excelências me corrigirão -, mas o Plenário deixa, neste julgamento, algumas coisas claras. Primeiro, que criação, extinção, modificação de serventias extrajudiciais são matérias que dizem respeito à organização e divisão judiciárias e que só podem ser levadas a cabo mediante lei em sentido estrito, de iniciativa do Tribunal de Justiça. Segundo, a despeito dessa incompatibilidade teórica com as normas constitucionais que ditaram, sobretudo, os julgamentos das ADIs nº 4.140 e 4.153, de 29 de junho último, que os efeitos das resoluções (na verdade, provimentos 747/2000 e 750/2001 – nota minha) ficam, no entanto, preservados até o encerramento total do sétimo concurso, que está praticamente esgotado na sua eficácia prática.”

Definiu-se, embora improcedente a ação, que o Provimento CSM n.º 747/2000 e o Provimento CSM n.º 750/2001, cujas constitucionalidades foram questionadas, produziriam efeitos somente até o encerramento total do 7.º Concurso Público de Provas e Títulos para Outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de São Paulo.

Vale dizer, os Provimentos acima identificados não foram extirpados do ordenamento jurídico, tanto que improcedente a ação, porém, ao juízo de improcedência, agregou-se, nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, empregadas ao tempo dos debates, “um obiter dictum, mas com eficácia.”

É certo que a Corregedoria Geral da Justiça tem entendido, por exemplo, nas hipóteses em que ocorre a primeira vacância, decorrente de morte ou aposentadoria de Titular, cuja especialidade é transferida a outra serventia, em razão da reestruturação prevista no Provimento 747/2000, que essa transferência ainda é possível, não obstante o resultado do julgamento da ADIN. 

O fundamento, que vem sendo utilizado amiúde, é o de que os Titulares dessas Serventias mantinham as atribuições por direito pessoal. Com o falecimento ou aposentadoria, configura-se a primeira vacância, com a consequente extinção da atribuição dos serviços, que deve ser declarada. A morte ou aposentadoria do Titular, segundo diversos pareceres dessa Corregedoria, não implica reestruturação, que já ocorreu quando da edição do Provimento 747/2000, mas só afasta a causa impeditiva de sua implantação.

Raciocínio similar foi usado quando da instalação da Comarca de Santana do Parnaíba. O Município de Santana do Parnaíba foi elevado a Comarca pelo art. 5º da Lei Complementar nº 877, de 29 de agosto de 2000. Foi desanexado da Comarca de Barueri, abrangendo o Município de Pirapora do Bom Jesus. O Provimento 747, de 28 de novembro de 2000, diante da criação dessa Comarca, previu a reestruturação das serventias. Quase concomitantemente, portanto, criou-se a Comarca e reestruturaram-se as serventias. Contudo, tal como no exemplo acima, a efetiva reestruturação prendia-se a uma condição suspensiva: a instalação da Comarca. Instalada, afastou-se a causa impeditiva da reestruturação, que, porém, já ocorrera em potência.

Por esse raciocínio, o Provimento 747/2000 já exaurira seus efeitos antes do julgamento da ADIN. A reestruturação já ocorrera. Aguardava-se, somente, a instalação da comarca. Vale dizer, não houve desrespeito ao comando do Supremo Tribunal Federal.

A situação dos interessados, porém, é distinta. E só isso já é suficiente para afastar o argumento do princípio da confiança, pelo qual eles afirmam que a Corregedoria lhes incutiu a legítima expectativa de que fariam jus à acumulação. Ao contrário. A leitura atenta dos pareceres posteriores ao julgamento da ADIN 2.415 levava exatamente à direção contrária. Não há um parecer sequer que trate de situação similar à dos interessados. Albergar sua tese, aí sim, iria de encontro ao posicionamento adotado nos últimos cinco anos pela Corregedoria Geral da Justiça.

No caso deles, a elevação à categoria de Comarca ocorre apenas agora, no ano de 2016. Logo, nenhum desses Municípios está previsto, como Comarca, no Provimento 747/2000 e, consequentemente, nenhum deles conta com as especialidades de registro de imóveis ou de protestos.

Os interessados alegam, contudo, que o Provimento 747/2000 apenas não lhes outorgou a especialidade de protestos porque seus municípios ainda não eram comarcas. No entanto, já tinham uma potencial titularidade à especialidade de protestos, dado que ela é ínsita à função notarial. Bastava, portanto, a elevação e, automaticamente, a acumulação passaria a ser de seu direito.

O raciocínio não se afigura correto. 

Em primeiro lugar, não é verdade que a função notarial implique ou abranja a função de protestos. Ainda que ambos sejam denominados notários ou tabeliães, são funções distintas. O art. 5º, da Lei n. 8.935/94 dispõe sobre os tabeliães de notas no seu inciso I e os tabeliães de protestos no seu inciso III.

Em segundo lugar, a regra, exposta no art. 26, é de que os serviços não são acumuláveis. A exceção, prevista no parágrafo único, é de que possam sê-lo, nos municípios que não comportem, em razão do volume de serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços.

É certo que o Provimento 747/2000, ao reorganizar a estrutura de delegações no interior do Estado, acumulou, nas comarcas de menor porte ou intermediário, os serviços de notas e de protestos.

Porém, essa acumulação não é cogente. Não há qualquer dispositivo que obrigue o administrador ou o legislador a, automaticamente, acumular especialidades em uma serventia.

Concordo que, com a elevação desses municípios à categoria de comarca, é preciso que se instalem os serviços de protestos e de registro de imóveis. Mas como eles serão instalados? Cumular-se-ão a serventias já existentes ou serão criadas novas serventias, específicas, de protestos e de registro de imóveis?

A lógica do Provimento 747/2000 levaria a crer na primeira opção. Mas, como dito acima, não é o provimento 747/2000 que regula a situação dos interessados. A acumulação ou a criação de novas serventias depende de lei. Consequentemente, a opção por acumular as funções ou criar novas serventias também depende de lei. 

Daí, aliás, mais uma razão para que a Corregedoria não disponha sobre o assunto por ato administrativo. Não há como prever qual seria a opção do legislador acerca da conveniência e oportunidade em se criarem novas serventias ou se acumularem as funções. Cabe à lei, em sentido formal, fazê-lo. Da mesma maneira como cabe ao legislador extirpar a quebra do principio da isonomia, que, efetivamente, passará a existir com a elevação.

Por fim, o art. 2º, inciso III, do Provimento 747/2000 - caso se entendesse pela possibilidade de a situação dos interessados ser por ele regulada – não tem aplicação. Ele trata de desacumulação e acumulação sequenciais de uma dada especialidade, pressupondo o recebimento por uma serventia e a perda dessa mesma especialidade pela outra serventia. Não é o caso aqui discutido.

Reputo oportuno, em arremate, reproduzir, em sua íntegra, ofício que venho remetendo a diversos Municípios e Comarcas do Estado de São Paulo, quando instado sobre a criação de novas unidades. A reprodução se faz necessária, a fim de que haja conhecimento geral sobre o atual impasse criado a respeito do tema e a absoluta ausência de responsabilidade da Corregedoria Geral da Justiça. Eis o teor, que bem explica o histórico dos fatos:

“No Estado de São Paulo, com a edição da Lei nº 8.935/94, que regulamentou o artigo 236 da Constituição Federal, foram realizados estudos no âmbito da Corregedoria Geral da Justiça, que culminaram com elaboração de parecer aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça no final do ano de 1995, disciplinando a aplicação dos artigos 38 e 44 da referida Lei. Alguns anos depois, o Conselho Superior da Magistratura editou os Provimentos 747/2000 e 750/2001, que, com fulcro nas conclusões do parecer aprovado pela Corregedoria Geral da Justiça, promoveram uma completa reestruturação dos serviços notariais e de registro no interior de São Paulo.

Em 2005, foi elaborado um novo parecer de caráter normativo, aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, que instituiu procedimento próprio, para que o Tribunal de Justiça, no uso de suas atribuições, promovesse a criação, extinção, acumulação e desacumulação de unidades e de atribuições de serviços notariais e de registro. Ficou determinado que as propostas de alteração da estrutura organizacional destes serviços, depois de autuadas e processadas, com a ouvida dos interessados, seriam apreciadas pela Corregedoria Geral da Justiça, deferindo-as ou não.

Esse sistema, porém, não pôde mais ser observado, em razão do decidido em sessão plenária do Supremo Tribunal Federal, realizada no dia 22 de agosto de 2011, na qual houve o julgamento da ADI 2415, ajuizada pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil – Anoreg, em face do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, e, nela, questionava a constitucionalidade dos Provimentos 747/2000 e 750/2001. O V. Acórdão concluiu pela improcedência da ação e manteve os efeitos dos provimentos, estendendo-os até o término do 7º Concurso Público de Provas e Títulos para Outorga de Delegações de Notas e Registro, mas determinou que, a partir de então, qualquer nova reestruturação dos serviços extrajudiciais deveria ser feita por lei de iniciativa do Tribunal de Justiça.

À vista desta situação, instaurou-se expediente nesta Corregedoria Geral da Justiça (processo nº 2011/00156131) com o fim de se estabelecer um novo sistema, fundado na premissa de que a reestruturação depende de lei, de iniciativa do Judiciário, mediante elaboração de novas regras procedimentais, compatíveis com a decisão do Supremo Tribunal Federal. Essa tarefa é da Corregedoria Geral da Justiça, nos termos do disposto no artigo 28, XVIII e XIX, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça, que a encarrega de “propor as medidas convenientes ao aprimoramento dos serviços das delegações notariais e de registro” e “fiscalizar, em caráter geral e permanente, as atividades das delegações notariais e de registro”. 

A medida inicial tomada foi a de ouvir as entidades que representam as unidades de serviços extrajudiciais – Arisp, Anoreg, Sinoreg, Instituto de Protesto de Títulos do Brasil e Colégio Notarial – para o envio de sugestões ou manifestações a respeito.

Após ouvidas as referidas entidades, esta Corregedoria Geral da Justiça, em consonância com as manifestações apresentadas, decidiu aguardar o julgamento da ADI nº 4.223, proposta pelo Excelentíssimo Senhor Procurador Geral da República perante o Supremo Tribunal Federal, pela qual foram atacados o artigo 24, §2º, nº 6, e o artigo 17, §1º, do ADCT da Constituição do Estado de São Paulo, os quais dispõem, respectivamente, sobre a competência exclusiva do Governador de Estado a iniciativa de lei que disponham sobre criação, alteração ou supressão de cartórios notariais e de registro, e que a lei disporá sobre normas para criação, considerando-se os critérios de distribuição geográfica, densidade populacional e a demanda do serviço, bem como a fixação de prazo para a instalação dos cartórios criados e localização dos cartórios. Entende o senhor Procurador Geral da República que a atribuição constitucional é privativa do Poder Judiciário.

Assim sendo, aguarda-se o desfecho da referida ação direta de inconstitucionalidade, antes da propositura do projeto de lei à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo dispondo sobre o estabelecimento de novas regras acerca da criação ou extinção de cartórios extrajudiciais.” 

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submeto a Vossa Excelência, é no sentido de indeferir o pedido dos interessados.

Sub censura.
São Paulo, 15 de setembro de 2016.
(a) Swarai Cervone de Oliveira - Juiz Assessor da Corregedoria.

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, indefiro o pedido dos interessados. Publique-se, por três dias alternados, para amplo conhecimento. São Paulo, 15 de setembro de 2016. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS - Corregedor Geral da Justiça.

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