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21 de Novembro de 2017

União estável entre homossexuais que mantinham relacionamento aberto é reconhecida no TJSC

A 1ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em recurso sob a relatoria do desembargador Jorge Luis Costa Beber, reconheceu a existência e a dissolução de união estável homoafetiva entre dois homens, com todos os efeitos jurídicos daí decorrentes. De acordo com o TJSC, no 1º grau, ainda que o relacionamento afetivo tenha perdurado por mais de 10 anos, com notoriedade, convivência pública, contínua e duradoura, aliados à inequívoca intenção de formar um núcleo familiar, o pleito foi negado por se tratar de uma relação do tipo aberta, com contatos sexuais consentidos, tanto de um como do outro companheiro, com terceiras pessoas. A decisão do TJSC abre precedente jurídico com o entendimento de superação da monogamia, via de consequência da fidelidade.

Jorge Luis Costa Beber, relator do caso, afirma que a velocidade das mutações nos costumes sociais é bem diferente daquela que envolve a formação da jurisprudência, especialmente porque a própria lei estabeleceu pressupostos objetivos e subjetivos para admissão das uniões diversas do matrimônio tradicional. Destaca, ainda, que é preciso que a magistratura avance na análise desses pressupostos, com uma visão não reducionista, mitigando ao máximo a intervenção do Estado nas individualidades e nas escolhas que são exclusivas daqueles que elegem determinada forma de convivência.

“Eu não diria que existem barreiras no âmbito do Judiciário no tocante à união homoafetiva, notadamente porque a viabilidade desse tipo de união já foi chancelada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O que existe, a meu aviso, são entendimentos muito herméticos e restritivos sobre formas de união diversas do modelo monogâmico, o que é uma realidade insofismável na sociedade, não sendo razoável, portanto, negar proteção a direitos que derivam desses tipos não ortodoxos de relações afetivas equiparadas ao casamento”, afirma.

Para o desembargador, a decisão proferida terá alguma importância no meio jurídico, na medida em que for compreendida como sinalização da necessidade do Poder Judiciário estar afinado e em constante sintonia com as temáticas familiares em seus múltiplos espectros, o que exige imprescindível afastamento de posturas estanques e conservadoras. “E não há nenhuma novidade nesse posicionamento, na exata medida em que o STF, por ocasião do julgamento do RE nº  898.060, Rel. Min. Luiz Fux, averbou a impossibilidade de redução das realidades familiares a modelos preconcebidos, além de reconhecer expressamente a atipicidade constitucional do conceito de entidades familiares”, conclui.

Com a decisão, os ex-companheiros tiveram a união reconhecida e encerrada na sequência, com a respectiva partilha dos bens havidos na constância da relação. O patrimônio em questão envolve imóvel e um veículo avaliados em R$ 2 milhões. Uma das partes alegava ter vivido apenas um namoro. A decisão da câmara foi por maioria de votos, em julgamento com colegiado ampliado. O processo corre em segredo de justiça.

De acordo com Patrícia Gorisch, presidente da Comissão de Direito Homoafetivo do IBDFAM, a decisão foi justa, pois o casal tem o direito de determinar como será a relação. “Ao Estado não cabe esse tipo de interferência. A lei prevê que na União estável não se requer fidelidade, mas sim lealdade. No casamento já mostra que um dos deveres é a fidelidade, mas se o casal combinar que não precisa desse dever, que nenhum dos dois precisa disso, não vejo motivos para o Estado ser contra. Muito pelo contrário, temos o livre direito do planejamento familiar, que é constitucional e humano”, destaca. 

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