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19 de Fevereiro de 2018

Mário Luiz Delgado: "É preciso desjudicializar, tirar do Judiciário o máximo de questões"

Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP) e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Mario Luiz Delgado é Presidente da Comissão de Assuntos Legislativos do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e concedeu entrevista à Arpen-SP para falar sobre o atual fenênome da desjudicialização e sobre os novos provimentos publicados pelo CNJ. Confira:

Arpen/SP - Os novos Provimentos editados pela Corregedoria Nacional de Justiça trouxeram mudanças importantes no Registro Civil. Qual sua avaliação sobre elas?

Mário Luiz Delgado - Os provimentos vêm numa onda de desjudicilização das questões relativas ao Direito de Família. É um movimento irreversível, o de deixar para o Judiciário apenas o residual, ou seja, as exceções de problemas que surjam após a pratica dos atos registrais. Essa é uma tendência, não só do Direito de Família, mas em todas as áreas. É preciso desjudicializar, tirar do Judiciário o máximo de questões e os Provimentos vêm dentro desta linha.

 
Arpen/SP - Como vê a possibilidade do reconhecimento de paternidade/maternidade socioafetiva ser feito diretamente nos cartórios? Quais são as vantagens para a população deste tipo de procedimento?

Mário Luiz Delgado - Acho que é avanço porque retira a necessidade de uma ação judicial para se reconhecer isso. A partir do momento que o Supremo Tribunal Federal reconheceu em sede de repercussão geral, com recurso extraordinário, a possibilidade da concomitância de mais de um vinculo de paternidade, não faz mais sentido que esse reconhecimento seja atribuição exclusiva do Poder Judiciário. Ele só vai intervir quando houver dúvida, fraude e contestação, por exemplo. Mas, para o registro em si, não há necessidade. Acho que o Provimento vem em boa hora e assegura uma maior agilidade na concretização de um direito que foi reconhecido pelo STF.
 

Arpen/SP - Como vê a possibilidade de que, mesmo existindo pai e mãe registrais, seja feito o reconhecimento de paternidade/maternidade direto em cartório?

Mário Luiz Delgado - A possibilidade de sobrepor um vínculo de paternidade, de se acrescer um vinculo em beneficio do filho, é um objetivo importante. É o principio do melhor interesse para a criança que vai ter a sorte de ter a possibilidade de apoio material e imaterial, cncretizando o principio de melhor interesse a criança.
 

Arpen/SP - O Direito de Família tem passado por sucessivas mudanças nos últimos anos. Em sua opinião, os registros públicos têm acompanhado esta evolução?

Mário Luiz Delgado - Os registros públicos tem tentado acompanhar o Direito familiar, mas penso que precisam abrir mais a sua interpretação, a “cabeça” para as novas realidades de vida, novas entidades familiares, e novas situações que nos são trazidas e precisamos estar preparados para elas.
 

Arpen/SP - Em sua opinião, existem outros procedimentos que poderiam ser feitos diretamente em cartório, sem a necessidade de processo ou homologação judicial (como os processos de habilitação de casamento)?

Mário Luiz Delgado - Vários, acho que a mudança de regime de bens durante o casamento é um exemplo disto. Já realizamos a desjudicialização do divórcio, mas se alguém quiser mudar o seu regime de bens precisa de um procedimento judicial. Existem situações como esta, que realmente vejo – num futuro próximo – como atribuições do Registro Civil.
 

Arpen/SP - O novo Provimento trouxe também mudança quanto aos registros feitos com base nas técnicas de reprodução assistida. Como avalia as mudanças introduzidas pelo novo regramento?

Mário Luiz Delgado – O Provimento tenta suprir algumas lacunas dessa matéria. É um dos temais mais importantes no Direito de Família sobre o qual não há legislação nenhuma. Hoje nós vivemos sobre o julgo do Conselho Federal de Medicina e agora das normas administrativas do Registro Civil que vem nessa tentativa de suprir essa lacuna do legislador, que é importante e ao mesmo tempo grave, porque nos deixa numa situação de insegurança jurídica.

 
Arpen/SP - Com a equivalência do casamento à união estável para fins de sucessão, não seria importante que a união estável fosse também registrada em cartório?

Mário Luiz Delgado - Ele é feito como elemento de prova e eu acho que ele é importante para fornecer segurança jurídica àquela relação, porque você facilita a prova de sua existência. Mas, colocar como requisito da união estável o registro para os fins sucessórios estaríamos desnaturando a entidade familiar da união estável, cuja característica principal é a informalidade, o fato dela se constituir pela convivência e não pelo registro e documento. 
 

Arpen/SP - Como avalia a importância dos cartórios para a sociedade?

Mário Luiz Delgado - Cumprem um papel fundamental no registro da vida em sociedade e, cada vez mais, assumem o papel da regulação de situações que estavam restritas ao Poder Judiciário, que causa um enorme prejuízo às partes em razão da burocracia e morosidade, entre outros problemas. Por isso o Registro Civil tem cumprido um papel muito importante e ainda tem ampliada a sua importância.

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