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08 de Abril de 2020

Artigo - Emancipei meu e-mail - por Marco Antonio de Oliveira Camargo
 

Este autor, em uma longa carreira na área notarial, já fez muitas Escritura Públicas de Emancipação, mas foi somente neste início de abril que pessoalmente envolveu-se em um procedimento diferente: a emancipação de um endereço eletrônico (e-mail)

Em um passado distante, criei com alguma reflexão um bom endereço eletrônico; fiz seu cadastro no provedor de acesso à internet; cuidei de sua divulgação pública e fiz com que ele constasse em impressos e formulários diversos do cartório onde trabalhava.

Aquele endereço eletrônico foi companheiro de longas horas de atenção e cuidado. Era um amigo fiel aquele e-mail.  Para melhor ilustrar a história, façamos de conta que tal endereço fosse: legal@uil.com.br.

Quis o destino, entretanto, que houvesse a separação entre o criador e a criatura. O tabelião desligou-se daquele cartório e deixou como legado para seus sucessores o uso daquele endereço único na Rede Mundial de Computadores.

Sem litígios ou conflito aconteceu aquele divórcio. Foi um abandono consentido, motivado por uma escolha pessoal deste autor. Deixadas senhas e portas abertas para o sucessor cuidar daquele endereço que muito bem identifica o cartorio; até mesmo o computador pessoal do tabelião foi deixado naquele cartório.

Após o abandono, por mais de uma década aquele endereço ainda continuou vinculado à conta pessoal deste autor no provedor de acesso onde registrado. Admitido como real o endereço indicado acima, o provedor seria o uil que está indicado logo depois do símbolo arroba (aliás, no passado discutiu-se a utilidade de “traduzir” o símbolo @ para a expressão “aos cuidados de”, seria coerente com a situação, mas a ideia não pegou).

Em tempos de isolamento social, buscando coisas diferentes para fazer (peço vênia, mas não posso evitar de escrever nesta hora: maldito Covid-19!), resolvi fazer uma faxina digital e me deparei com o endereço abandonado, ainda sob minha responsabilidade naquele servidor.

Escrevi para o endereço e questionei se ainda usavam aquela ferramenta. A resposta veio rápida e afirmativa. Sim; aquele e-mail ainda era utilizado e, apesar de ter sido tentado, não se conseguiu desliga-lo da minha pessoa.

A solução para a atualização depende de minha iniciativa junto ao servidor.

Busquei então o Serviço de Atendimento ao Consumidor e, não sem alguma dificuldade inicial, consegui um atendimento pessoal (foi acessado atendimento via chat pois as perguntas feitas não foram compreendidas pelo robô assistente que atendeu em primeiro lugar).

A dúvida era sobre como ceder o direito de uso de um endereço de e-mail para terceiro. Do outro lado da linha de comunicação, a atendente respondeu à minha dúvida com outa pergunta:

-Você quer emancipar um e-mail?

Questionar tabelião sobre emancipação, nem de longe assemelha-se a isso. Foi uma surpresa aquela definição, mas como existia a perspectiva de solução do problema, respondi apenas:

-Assim é se lhe parece. Não conhecia o termo, mas é isso mesmo que eu preciso!

-Neste caso o Sr deve ligar no Telefone de Atendimento 0400XXXX.

Encerrado o chat, iniciei a ligação telefônica. Na medida em que o atendente demonstrou simpatia e atenção, algo pouco usual neste segmento, não resisti a minha inquietação e comentei sobre o estranhamento com aquele nome adotado; disse-lhe que sou tabelião, faço emancipação de pessoas e que jamais havia imaginado a emancipação de um endereço de e-mail.

Meu interlocutor, com um riso mal disfarçado em sua voz, explicou-me que é assim mesmo, aquele procedimento é semelhante com o que ocorre com as pessoas; ele acontece quando o responsável por uma criação não quer continuar a ter poder sobre aquilo que criou.

Uma lição e tanto foi essa. Emancipar um e-mail é possível. Basta indicar ao provedor, correta e completamente, quem será o novo responsável pelo endereço, oferecer seu telefone, meios de contato e aguardar os procedimentos internos daquele provedor (o que aliás implica na destruição de todas as mensagens que estavam arquivadas até então e indissoluvelmente ligadas ao criador original).

O mesmo endereço será vinculado à uma nova conta de acesso e a caixa postal estará totalmente vazia de mensagens.
Mantido o endereço antigo e recebida uma caixa postal novinha. Vida nova para o e-mail emancipado.

Toma, que agora o filho é teu, colega!

**Marco Antonio de Oliveira Camargo é Oficial de Registro Civil e Tabelião de Notas em Sousas – Campinas – SP
 

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