Notícias

13 de Abril de 2021

Veja Saúde - Afinal, a Covid-19 está mesmo mais grave nos adultos jovens?

Está cada vez mais evidente que a Covid-19 não é perigosa apenas para os idosos. Em 2021, casos graves e mortes de adultos jovens pela doença dispararam no Brasil. Entre janeiro e março, o número de óbitos disparou 353% entre pessoas de 30 a 39 anos, e 419% na faixa etária dos 40 a 49 anos, segundo o último boletim do Observatório Covid-19, da Fiocruz.

Para ter ideia, o aumento na população em geral no mesmo período foi de 223%. A mortalidade segue superior em idosos, mas a idade média das vítimas do coronavírus baixou de 71 em janeiro de 2021 para 66 em março.

Dados dos Cartórios de Registro Civil mostram que, só em março, 21 mil brasileiros entre 30 e 59 anos morreram de Covid-19. É um número três vezes maior do que o observado entre julho e agosto do ano passado, quando houve outro pico da pandemia no país. À época, foram 7 mil óbitos.

“O perfil do paciente grave mudou. Estamos atendendo mais jovens, sem comorbidades, que muitas vezes chegam no hospital precisando de ventilação mecânica, inclusive intubação”, aponta a intensivista Viviane Cordeiro da Veiga, que coordena a UTI da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

O fenômeno é novo, mas existem diversas hipóteses para ele. E é provável que todas estejam ao menos parcialmente certas. Vamos a elas.

Mais jovens estão contraindo Covid-19

Vivemos o pior momento da pandemia, e o vírus está circulando principalmente entre os jovens. “Se temos mais pessoas infectadas nessa faixa etária, também teremos mais mortes e hospitalizações”, explica o infectologista Moacyr Silva Junior, do Hospital Israelita Albert Einstein.

Os dados da Fiocruz dão pistas que reforçam essa teoria. Do início do ano até meados de março, houve um aumento de 316% nos casos confirmados de Covid-19 na população em geral. Já entre quem tem 30 e 59 anos, o crescimento foi superior a 500%.

Ou seja, seria uma questão de o Sars-CoV-2 pegar quem está disponível, e não de ter desenvolvido uma preferência pelos mais jovens. Ora, a terceira idade já está sendo vacinada e possui uma percepção maior do risco de contágio. “Tanto que temos visto menos idosos internados”, explica Viviane.

Por outro lado, pessoas abaixo dos 60 tendem a se expor mais ao vírus, tanto por questões comportamentais (como a baixa adesão às máscaras e as constantes aglomerações), quanto por formarem a maioria da classe trabalhadora. Um levantamento encomendado pelo El País usou dados do Ministério da Economia para revelar que as mortes entre frentistas, motoristas e atendentes de caixa aumentaram no início do ano. Supõe-se que boa parte dessas vítimas não era idosa. 

Para citar um exemplo, também se suspeitava que jovens e crianças fossem mais suscetíveis à variante B.1.1.7, que predomina na Europa e nos Estados Unidos. Mas um trabalho recente, publicado no The Lancet Child & Adolescent Health, concluiu que, provavelmente, a subida dos casos nessa faixa etária é apenas um reflexo do descontrole da pandemia.

“Em termos de transmissão, o problema está no hospedeiro, e não no vírus”, resume Paulo Brandão, do blog Virosfera e da Universidade de São Paulo (USP).

As variantes do coronavírus seriam mais letais

Dada a mudança brusca dos pacientes críticos, os médicos também suspeitam que a variante P1 possa ser mais agressiva. Isto é, ela teria maior capacidade de desencadear consequências sérias mesmo em um organismo jovem e saudável. Aqui, de novo, há números corroborando a tese.

Segundo a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib), a mortalidade de pacientes com menos de 45 anos internados em unidades de terapia intensiva (UTIs) triplicou de 13% em meados de novembro para 38,5% em março. Isso significa que, para cada dez adultos jovens brasileiros internados numa UTI no mês passado, cerca de quatro não resistiram à doença.

Mas vale uma ponderação. Em novembro, reinava um período de relativa calmaria no ar, embora os casos estivessem voltando a subir. Já em março de 2021, a pandemia atingiu proporções nunca vistas no Brasil. Então é possível que a dificuldade de atendimento adequado tenha influenciado nesse índice, entre outras coisas.

“Para demonstrar uma suposta maior agressividade de uma linhagem, é necessário estudar pacientes infectados com variantes diferentes e comparar a resposta imune de cada um”, comenta Brandão. Ocorre que a reação da P1 parece igual à das outras. “É o mesmo processo inflamatório exacerbado que vemos nos idosos”, nota Viviane.

Ainda que a variante brasileira não se mostre mais violenta nos estudos, a letalidade nos jovens não deixa de ser preocupante. Dados mais recentes da Amib mostram que, em março, mais da metade dos internados em UTI tinham menos de 40 anos. “É grave o que está acontecendo. Com a livre circulação do vírus, continuamos sob o risco de surgirem novas mutações, inclusive mais agressivas”, alerta Brandão.

Demora para procurar atendimento

Por fim, pipocam entre os médicos relatos de jovens chegando em estado grave no pronto-socorro. “Eles tendem a não valorizar tanto sinais de piora, então buscam ajuda quando a insuficiência respiratória já apareceu e com o pulmão muito comprometido”, destaca Junior.
O uso de drogas comprovadamente ineficazes, como ivermectina, hidroxicloroquina e azitromicina, também atrasa a ida ao hospital. “As pessoas ficam esperando o remédio fazer efeito. Também vemos casos de indivíduos sendo admitidos já com complicações associadas ao ‘kit Covid’”, pontua Viviane.

Assine nossa newsletter