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07 de Novembro de 2008

Artigo - Justiça paulista reclama de orçamento em encontro do CNJ

Por Gláucia Milicio

A queixa quanto ao baixo orçamento do Judiciário paulista foi a tônica de mais um Encontro Regional do Judiciário, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça nessa quinta-feira (6/11) em São Paulo. No encontro, o desembargador Antonio Carlos Munhoz Soares, vice-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirmou que, sem dinheiro, só prática de gestão e inovações tecnológicas não resolvem o problema da Justiça. Munhoz Soares representou o presidente do tribunal, Roberto Vallim Belocchi.
O Conselho Nacional de Justiça está promovendo os encontros em diversas regiões do país com o objetivo de debater formas de modernizar a Justiça. Participaram do evento os conselheiros Andréa Pachá, Felipe Locke, Rui Stoco, Marcelo Nobre e Mairan Maia.
A abertura do encontro foi feita pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, no comando também do CNJ. Ele fez questão de comparecer para enfatizar a importância da Justiça paulista, seu papel de liderança no contexto nacional e para homenagear o esforço da magistratura de São Paulo em enfrentar o enorme desafio de atender a crescente demanda por Justiça.
De acordo com o desembargador Munhoz Soares, a falta de orçamento compromete diretamente a prestação jurisdicional e a celeridade na tramitação dos processos. "Em São Paulo, infelizmente, há uma parêmia [breve alegoria] no lugar do orçamento. O clima político no estado está nublado", desabafou.
A reclamação do desembargador é uma reação à proposta orçamentária de 2009 enviada recentemente à Assembléia Legislativa pelo governador José Serra. Ele reduziu em 40% o orçamento pedido pela Justiça. A proposta prevê para o tribunal um percentual de 4,22% do total do orçamento estadual, que é de R$ 116,1 bilhões. Desse total, estão reservados para o Judiciário R$ 4,9 bilhões. A solicitação do tribunal era de R$ 8,1 bilhões.
A presidente do Tribunal Regional Federal da 3º Região, Marli Ferreira, também criticou a pequena fatia do orçamento destinada à Justiça Federal em São Paulo. Reclamou também da falta de estrutura própria - 85% dos prédios são alugados. A desembargadora, no entanto, preferiu dar ênfase às práticas de boa gestão que implementou no tribunal.
Marli Ferreira foi buscar o conceito de administração pública para comandar o TRF-3. Criou o Banco de Talentos para valorizar e expandir o conhecimento de servidores. Promoveu reestruturação funcional, criou núcleo de gestão estratégica, implementou uma assessoria de estatística e informática, gestão ambiental e programas eletrônicos de gestão documental.
A desembargadora também falou, com orgulho, do Selo Verde que o TRF-3 recebeu da Vigilância Sanitária nacional, que é um reconhecimento pela sua preocupação com o meio ambiente e com a saúde. "Foi o primeiro tribunal do país a receber. Lá no meu tribunal, é proibido fumar", explicou.
Calcanhar de Aquiles
O TJ paulista, maior tribunal do mundo com 17 milhões de processos em tramitação, também apresentou soluções. O assessor da presidência, juiz Cláudio Augusto Pedrassi, foi o responsável por mostrar as práticas inovadoras da corte. Segundo ele, o gigantismo do tribunal é, na verdade, o calcanhar de Aquiles. O tribunal tem uma distribuição, na primeira instância, de 25 a 30 mil processos por dia, com uma taxa de crescimento de 12 a 17% ao ano. A distribuição em segundo grau chega a 36 mil processos por mês, apontou o juiz.
Para lidar com a alta demanda, Pedrassi conta que o TJ-SP sentiu a necessidade de criar secretárias especializadas, para cuidar da estrutura organizacional, da administração, da tecnologia e do planejamento de gestão, entre outras. Na parte de recursos humanos, o foco do tribunal é promover cursos de capacitação para os servidores.
"Para evoluir, é preciso pensar grande e começar pequeno, com um modelo replicável e implementá-lo em larga escala", ressaltou Pedrassi.
Pelo CNJ, a conselheira Andréia Pachá falou à revista Consultor Jurídico sobre os problemas apresentados pelo TJ-SP. "O tribunal tem se empenhado para resolver problemas crônicos, diferentemente de outros tribunais." Para ele, esses encontros promovidos pelo CNJ são importantes justamente por dar a possibilidade de conhecer cenários como o tribunal de São Paulo.
"A grande preocupação do TJ paulista é com o novo Judiciário. Ele busca uma gestão eficiente e um atendimento célere. Tudo isso é o meio para se chegar aos fins", disse o conselheiro Rui Stoco.
Falta de prática
O representante do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, juiz eleitoral José Joaquim Santos, não apresentou nenhuma prática de gestão da Justiça Eleitoral paulista. Segundo ele, por receio do Tribunal Superior Eleitoral, eles não ousam inovar. "Não temos muita liberdade para fazer mudanças estruturais. Não sabemos até onde os tribunais regionais podem avançar", justificou.
O conselheiro Rui Stocco aproveitou a deixa para falar da falta de contribuição. Contou experiências simples e inovadoras de outros tribunais. Citou práticas dos TREs do Rio Grande do Norte, Ceará e Bahia. Para ele, a "amarra" do TSE é apenas na questão da normatização.
Modelo de gestão
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) apresentou grandes inovações. Como numa grande empresa, definiu sua missão, traçou metas e começou a atender os jurisdicionados como clientes. O presidente da corte, juiz Décio Sebastião Daidone, criou grupos estratégicos, formados por servidores e magistrados, para dar eficiência tanto na gestão quanto na prestação jurisdicional.
Ele destacou que o tribunal procura um modelo ideal de gestão, mas de acordo com o tempo e o espaço que possui. Lá no TRT-2, a metodologia de trabalho é uma das principais preocupações. O tribunal chegou até a contratar serviço de consultoria da Fundação Getúlio Vargas.
O seu núcleo estratégico é composto por três grupos de trabalho. O G1 é de estratégia e seus membros são juízes, secretários da presidência, diretores da administração e da coordenação judiciária. O G2 é o grupo tático. Nele participam os diretores de secretaria. Já o G3 é o operacional, composto só por servidores. Os grupos se reúnem para traçar novas metas e resolver os problemas existentes.
No final do encontro, depois da troca de experiência entre os tribunais, os dirigentes das Justiças Estadual, Federal, Eleitoral e do Trabalho elaboraram uma carta com propostas e reivindicações do estado de São Paulo.
O documento será incorporado na consolidação de todas as sugestões dos tribunais, colhidas nos encontros promovidos pelo CNJ em todo o país. Todas as informações serão divulgadas em um Encontro Nacional marcado para o dia 16 de fevereiro em Brasília. Ainda este mês, haverá outros encontros regionais: no próximo dia 11, em Florianópolis, para lideranças do Judiciário de Santa Catarina e do Paraná, e no dia 17, em Recife, com representantes dos tribunais de Pernambuco e de Alagoas.
Participaram também do encontro em São Paulo membros da Justiça Militar, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas), da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho de São Paulo, da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e da Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul (Ajufesp).