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04 de Fevereiro de 2010

Decisão CGJ - Registro Civil das Pessoas Naturais - Averbação de segunda separação judicial, homologada por sentença proferida em data anterior à data da homologação da reconciliação

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG 2008/82698
(410/08-E)

Registro Civil das Pessoas Naturais - Averbação de segunda separação judicial, homologada por sentença proferida em data anterior à data da homologação da reconciliação - Recusa do Oficial Registrador, por ofensa à ordem cronológica dos atos - Decisão jurisdicional, porém, que, segundo se verifica, fez retroagir os efeitos da reconciliação à data do requerimento desta, anterior à da separação - Averbação que deve ser autorizada - Decisão acertada do Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente, que merece confirmação - Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra decisão do Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do 30º Subdistrito da Capital (Ibirapuera) que julgou improcedente dúvida por este último suscitada e determinou a averbação, à margem do assento de casamento, da separação consensual do casal Johann David Schnell e Availde Ormonde de Oliveira Schnell, homologada por sentença proferida em 07.10.2004, com anotação, ainda, na averbação de anterior reconciliação, de que esta última foi requerida em 10.10.2002, apesar de homologada por sentença proferida em 19.09.2006 (fls. 421 a 423).

Sustenta o Recorrente que, antes da prolação da decisão recorrida, requereu a comprovação pelo interessado Johann David Schnell, mediante apresentação de certidão imobiliária, da partilha dos bens do casal, tendo em vista a não participação da comunheira Availde Ormonde de Oliveira Schnell no procedimento instaurado, a fim de aferir se houve ou não preservação da meação desta última. Acrescenta, ainda, que tal providência se mostra necessária para preservação da segurança dos registros públicos em face de terceiros, na eventualidade de ter havido alienação de bens por parte do varão sem a anuência da mulher. Dessa forma, pretende o Recorrente a reforma da decisão proferida, para que se proceda à intimação de Availde Ormonde de Oliveira Schnell, permitindo-se, com isso, que esta última se manifeste nos autos e informe sobre a partilha realizada, cancelando-se a averbação deferida e já efetivada (fls. 427 a 433).

Vieram contra-razões ao recurso, apresentadas pelo interessado Johann David Schnell, em que este último se bate pela manutenção da decisão proferida, argumentando, em acréscimo, com a desnecessidade das providências pretendidas pelo Recorrente (fls. 439 a 453).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se no sentido do improvimento do recurso (fls. 456 a 460).

É o relatório.

Passo a opinar.

De início, cumpre observar que o dissenso existente, no caso, entre o interessado e o Oficial Registrador, diz respeito à prática de ato de averbação e não de ato de registro em sentido estrito, de sorte que a matéria comporta discussão pela via do processo administrativo comum e não da dúvida registral, tal como suscitada inicialmente pelo Registrador e decidida pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente.

Nada impede, porém, o aproveitamento do procedimento, para exame do tema de fundo, conhecendo-se da apelação interposta como recurso administrativo previsto no art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, cuja apreciação é da competência desta Corregedoria Geral da Justiça.

E, quanto ao cerne do dissenso, o recurso interposto, salvo melhor juízo de Vossa Excelência, não comporta provimento, impondo-se a manutenção da respeitável decisão de primeira instância administrativa, em conformidade, ainda, com os argumentos expendidos pelo Recorrido e o parecer da Douta Procuradoria Geral de Justiça.

Com efeito, os elementos de convicção constantes dos autos evidenciam que Availde Ormonde de Oliveira Schnell e Johann David Schnell obtiveram, em 20.09.2001, sua separação judicial por sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional de Santo Amaro, separação essa devidamente averbada à margem do assento de casamento existente no Registro Civil das Pessoas Naturais do 30º Subdistrito da Capital (fls. 108). Um ano depois, em 10.10.2002, Availde e Jonhann formularam requerimento de reconciliação nos mesmos autos (fls. 90 e 91), pleito esse que não chegou a ser homologado, devido à omissão das partes interessadas em apresentar documento solicitado pelo Ministério Público (fls. 92 a 94). Na seqüência, acreditando estar regularizada a reconciliação, os cônjuges requereram, perante o Juízo da 4ª Vara da Família e Sucessões do mesmo Foro Regional, nova separação consensual, a qual foi homologada por sentença proferida em 07.10.2004 (fls. 178).

Ocorre que, ao apresentarem mandado judicial para averbação da segunda separação, verificaram os ex-cônjuges que do assento de casamento constava apenas a anotação da primeira separação, sem averbação da reconciliação, a qual não havia sido homologada até aquele momento. Providenciado o prosseguimento do pleito de reconciliação, para averbação no Registro Civil, obtiveram os interessados, finalmente, a sua homologação, por sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Família e Sucessões, datada de 19.09.2006 (fls. 111).

Averbada a reconciliação no assento de casamento, defrontaram-se, então, os ex-cônjuges com a recusa do Senhor Oficial Registrador em averbar a segunda separação, devido à data desta última (07.10.2004), anterior à da reconciliação (19.09.2006), o que implicaria ofensa à ordem cronológica dos atos. Assim, conforme informado pelo Registrador (fls. 02 a 04), averbada a reconciliação do casal, ocorrida em 2006, restaria inviabilizada a averbação posterior de separação realizada em 2004.

Diante do impasse surgido, requereu o ora Recorrido à Meritíssima Juíza de Direito da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional de Santo Amaro a expedição de novo mandado de averbação concernente à reconciliação, com o reconhecimento da produção dos efeitos desta a partir do requerimento inicialmente formulado (10.10.2002) - fls. 116 a 119. Tal pleito deu ensejo à expedição de novo mandado pelo referido Juízo, em que se determinou ao Senhor Oficial do Registro Civil a averbação do restabelecimento da sociedade conjugal estabelecida entre Johann e Availde, por força de sentença proferida em 19.09.2006, devendo constar, ainda, da anotação a ser realizada "que o pedido de restabelecimento foi feito nos autos em 10/10/2002, ressalvando-se direitos de terceiros" (fls. 10).

Parece claro do teor do último mandado expedido que houve, no caso, decisão judicial específica, proferida na esfera jurisdicional, por meio da qual a Meritíssima Juíza de Direito da 3ª da Família e Sucessões do Foro Regional de Santo Amaro, considerou concretizada a reconciliação do casal em 10.10.2002, data do requerimento inicial, muito embora a sentença homologatória correspondente somente tenha sido proferida em 19.09.2006. Por outras palavras, ao que se pode verificar, a Meritíssima Juíza de Direito fez retroagir os efeitos da reconciliação - repita-se, homologada em 19.09.2006 - à data do requerimento inicial (10.10.2002), ressalvando, de maneira expressa, direitos de terceiros.

Não cabe discutir, aqui, no âmbito administrativo, o acerto da decisão proferida, ante a natureza constitutiva da sentença que homologa a reconciliação dos cônjuges e os efeitos dela decorrentes, que se produzem, normalmente, ex nunc. O que efetivamente importa, no caso, é que houve decisão jurisdicional reconhecendo a reconciliação do casal no ano de 2002, com determinação, dirigida ao Senhor Oficial Registrador, para que tal circunstância seja anotada na averbação correspondente, a título de retificação do ato anteriormente praticado, à vista do primeiro mandado (fls. 09).

E tal pronunciamento jurisdicional é o suficiente para autorizar a prática do ato pretendido, mostrando-se inviável, na esfera administrativa, ao Oficial Registrador, ao Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente e mesmo à Corregedoria Geral da Justiça, rever a decisão proferida naquela outra sede (a jurisdicional).

Como tem decidido reiteradamente esta Corregedoria Geral da Justiça, "(...) no sistema jurídico-constitucional brasileiro, admite-se que os atos dos demais Poderes do Estado - legislativos e administrativos - sejam revistos pelos juízes no exercício da jurisdição, mas o contrário, ou seja, a revisão dos atos jurisdicionais dos juízes pelas autoridades legislativas ou administrativas, é absolutamente inadmissível (Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, vol. I, p. 310)." (Proc. CG n. 11.394/2006; Proc. CG n. 136/2006).

Daí o acerto da decisão proferida em primeira instância administrativa, a qual nada mais fez do que determinar o cumprimento daquilo que já constava da ordem judicial expedida pela Meritíssima Juíza de Direito da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional de Santo Amaro, a fim de que o registro civil, na espécie, possa espelhar, fielmente, o que, no final das contas, de fato se passou na seqüência lógica e cronológica dos acontecimentos (separação do casal; reconciliação do casal; nova separação do casal).

Questões outras, relacionadas à partilha de bens e à proteção da meação da mulher, levantadas pelo Recorrente, extrapolam, como anotado pela Douta Procuradoria Geral de Justiça (fls. 458), a matéria propriamente registral, única que, nesta sede, comporta análise e decisão. Daí por que desnecessária se fazia, na hipótese, a intervenção de Availde Ormonde de Oliveira Schnell no feito, valendo consignar que o Recorrido tem ampla legitimidade para pleitear, isoladamente, o cumprimento do mandado, na forma em que expedido pelo Juízo da Vara da Família.

Portanto, em que pesem os argumentos expendidos pelo Recorrente, nenhum reparo merece a respeitável decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente. Ao recurso interposto, conseqüentemente, deve ser negado provimento.

Nesses termos, o parecer que se submete à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto.

Sub censura.

São Paulo, 30 de dezembro de 2008.

ÁLVARO LUIZ VALERY MIRRA

Juiz Auxiliar da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. Publique-se. São Paulo, 08.01.2009. - (a) - RUY PEREIRA CAMILO - Corregedor Geral da Justiça.

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