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25 de Agosto de 2004

Artigo - O princípio da autonomia do registrador imobiliário - procedimento de retificação de registro consensual - Por João Pedro Lamana Paiva

Os serviços Notariais e de Registro existem em nosso País desde o século XIX, com a finalidade de dar publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos que são levados a registro, assegurando aos usuários a Paz Jurídica almejada por todos, uma vez que o Notário e o Registrador trabalham na prevenção de litígios, ao passo que o Magistrado atua na ruptura da ordem jurídica, buscando o seu restabelecimento.
Como se sabe, os serviços Notariais e de Registro são descentralizados e exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, mediante concurso de provas e títulos, promovido pelo Poder Judiciário, que fiscaliza os atos nos termos da lei.
Assim, essas atividades pertencem ao Estado, no Brasil e no Mundo. Porém, no que se refere ao Registro de Imóveis, alguns Países preferem não exercer diretamente a atividade - como por exemplo no Brasil, no Chile e no Equador aqui na América e na Espanha e parte da Itália, no continente europeu -, delegando a uma pessoa natural, profissional do Direito, via de regra, a qual responde civil, administrativa e criminal pelos danos causados a terceiros.
Por outro lado, o Registrador Imobiliário é independente no exercício das suas atribuições, em função do que dispõe o artigo 236, da Constituição Federal de 1988, cuja regulamentação se deu com a Lei nº 8.935/94, modificando e fortalecendo o regime jurídico dessas relevantes atividades e, assim, consolidando sua independência funcional. Com isso, os Registradores e Notários passaram a deter maior liberdade de atuação, sem precisar submeter corriqueiramente seus atos ao controle do Poder Judiciário, a exemplo da homologação da contratação de funcionários, abertura de livros etc., hoje apropriadamente abolidas. Por outro lado, surgiram novas responsabilidades, exigindo maior preparo científico e técnico.
Agora, passado dez anos da modificação da estrutura organizacional dos Serviços, foi sancionada, em 2 de agosto de 2004, a Lei nº 10.931, que dispôs sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Bancário, bem como alterou o Decreto-Lei no 911/69, as Leis números 4.591/64, 4.728/65, 10.406/02, 6.015/73 e deu outras providências.
No que concerne a esta breve exposição, será mencionada apenas a notável alteração nos artigos 212 ao 214, da Lei dos Registros Públicos LRP (Lei nº 6.015/73), no que se refere ao procedimento de RETIFICAÇÃO no Registro Imobiliário, até então burocrático, moroso e dispendioso, pois, via de regra, o procedimento era judicial.
Tal modificação, que foi introduzida pelo artigo 59 da novel legislação, já está em vigor e é bem-vinda, pois trouxe para a sociedade uma forma ágil de retificar registros e/ou averbações, exigindo maior proficiência e acuidade dos Oficiais de Registro Imobiliário. O novo desafio está lançado aos nobres Registradores como operadores do Direito, requerendo estudo e profissionalismo, uma vez que o procedimento administrativo de retificação a ser adotado é de consenso, isto é, exige a anuência de todos os interessados.
Segundo o caput do artigo 212, "se o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, a retificação será feita pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, por meio do procedimento administrativo previsto no art. 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial". Já o parágrafo único estabelece que "a opção pelo procedimento administrativo previsto no art. 213 não exclui a prestação jurisdicional, a requerimento da parte prejudicada". Dos referidos enunciados conclui-se o seguinte: a) que a retificação poderá ser tanto de registro, quanto de averbação e ainda de matrícula; b) deverão ser observados os princípios da territorialidade e da rogação, em alguns casos; e, c) a jurisdicionalização passou a ser uma faculdade do interessado e da parte prejudicada, não mais compulsória.
Quanto ao artigo 213, que trata do rol de atos retificáveis, o desenvolvimento do assunto se dará em momento oportuno, em um trabalho exclusivo, pela sua especialidade e abrangência de conteúdo. O artigo 214 da LRP traz a possibilidade de o juiz determinar o bloqueio da matrícula quando uma demanda anulatória de registro/averbação ensejar possíveis danos de difícil reparação, impossibilitando o lançamento de qualquer ato registral.
Assim, analisando a Lei nº 10.931/04 e sabendo que o Registrador Imobiliário é um profissional do Direito dotado de fé pública, entende-se que ele poderá realizar retificações desde que esteja convencido das provas apresentadas, independentemente da participação do digno órgão do Ministério Público e do excelso Poder Judiciário. Todavia, havendo impugnação, remeterá o processo ao juiz competente que o decidirá.
Diante do exposto, havendo consenso entre as partes, todas as hipóteses de retificações constantes do artigo 213 da LRP poderão ensejar a averbação de retificação pelo próprio Oficial, aclamando uma verdadeira autonomia registral face à nova realidade jurídica outorgada ao Registrador de Imóveis. Porém, pode-se afirmar que em não havendo acordo ou havendo prejuízo ao confrontante, caberá ao Judiciário decidir.
Finalmente, conclui-se que a Lei nº 10.931/04 é mais uma conquista dos Registradores Imobiliários, principalmente pelo lançamento e fixação do princípio da autonomia, o qual, somado à independência funcional, valorizou sobremaneira a atividade desempenhada. Contudo, o sucesso pleno apenas será obtido se formos, nós, os Registradores, céleres e eficientes na aplicação da lei, pois é este o seu propósito, atendendo aos anseios da sociedade e desafogando o Poder Judiciário. Cumpramos com critério ao nosso dever.

Autor: João Pedro Lamana Paiva é Registrador Imobiliário e Vice-Presidente e Diretor de Relações Internacionais do IRIB

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