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23 de Julho de 2011

Jurisprudência TJ-RS - Apelação cível - Ação de retificação de registro civil - Conversão aos costumes muçulmanos - Acréscimo de apelidos

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. CONVERSÃO AOS COSTUMES MUÇULMANOS. ACRÉSCIMO DE APELIDOS. INDEFERIMENTO. Não estando presentes as hipóteses autorizadoras previstas no art. 57 da lei dos registros públicos para a modificação do nome da autora na forma pretendida, impunha-se o indeferimento do pleito. A conversão da autora à religião islâmica e aos costumes muçulmanos, embora relevante para a pessoa que os adotou, não constitui situação excepcional prevista em lei que justifique a inclusão dos apelidos pretendidos ao seu nome. APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJRS - Apelação Cível nº 70039794748 - Carazinho - 7ª Câmara Cível - Rel. Des. André Luiz Planella Villarinho - DJ 15.06.2011)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desprover a apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) E DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA.

Porto Alegre, 08 de junho de 2011.

DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO- Relator.

RELATÓRIO

DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO (RELATOR)

Trata-se de apelação interposta por Maria R.K., nos autos da ação de retificação de registro civil que move, contra a sentença de fl. 48 e v. que indeferiu o seu pedido.

Sustenta a autora na apelação (fl. 50-56) que vem de uma família cigana e de tradição muçulmana, porém, foi entregue para adoção assim que nasceu, sendo criada por um casal brasileiro. Na adolescência passou a questionar suas origens, tendo descoberto que foi fruto do amor proibido entre seu pai árabe e sua mãe espanhola. Somente após a morte dos seus pais adotivos é que se sentiu livre para buscar sua verdadeira origem.

Aduz que seus genitores eram ciganos, e o nome do seu verdadeiro pai é CHALLITA e o nome do seu avô paterno é ALAMUR. Na busca das suas origens acabou conhecendo o islamismo, identificando-se com as tradições islâmicas, tendo se convertido ao islamismo, sendo reconhecida como uma legítima cidadã muçulmana, conforme comprova o documento emitido pela Sociedade Beneficente Muçulmana de Passo Fundo, que declara que a apelante é conhecida como KHADIJAH CHALLITAALAMUR, vez que todo muçulmano tem direito de manifestar sua fé através de nome diferenciado.

Assim, é reconhecida pelo nome que ora pretende adotar legalmente, e não apenas junto a seus irmãos e irmãs muçulmanos, mas por toda a sociedade onde vive, sendo público e notório o nome adotado pela requerente, conforme as declarações trazidas aos autos.

Assevera que após a conversão ao islamismo, é muito comum a adoção do nome muçulmano. Diz que há muitos anos almeja a mudança de seu prenome, vez que ninguém a chama pelo prenome, e sim pelo apelido KHADIJAH. É reconhecida como uma legítima cidadã muçulmana, de nome KHADIJAH CHALLITAALAMUR. Cita os arts. 56, 57 e 58 da Lei dos Registros Públicos.

Requer o provimento do recurso para que seja autorizado a inclusão do apelido KHADIJAH CHALLITAALAMUR ao seu prenome, passando a se chamar, assim, KHADIJAH MARIA ROSANE CHALLITAALAMUR KOTHE.

Neste grau, o Ministério Público, através da eminente Procuradora de Justiça, Dra. Marcia Leal Zanotto Farina, ofertou parecer pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando estabelecido pelos artigos 549, 551 e 552, todos do CPC.

É o relatório.

VOTOS

DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO (RELATOR):

Trata-se de apelação interposta por Maria R.K., nos autos da ação de retificação de registro civil que move, contra a sentença de fl. 48 e v. que indeferiu o seu pedido.

Cuida-se de pedido deduzido por MARIA ROSANE KOTHE, que pretende incluir no seu nome os apelidos KHADIJAH CHALLITAALAMUR, para passar a se chamar KHADIJAH MARIA ROSANE CHALLITAALAMUR KOTHE, por ter se tornado assim conhecida na comunidade onde vive, principalmente na comunidade muçulmana de Passo Fundo, tendo adotado as tradições islâmicas.

O tema é interessante. Todavia, tenho aderido à corrente que privilegia a aplicação da lei, pois a retificação do nome somente se justifica em casos excepcionais, do que não se cuida na espécie, ausentando-se fundada razão que possa interferir na cadeia do registro dos patronímicos de família, vedado no art. 56 da Lei dos Registros Públicos.

Ainda que o art. 58 da Lei dos Registros Públicos admita a substituição do prenome por apelidos públicos notórios, e existam nos autos declarações e o depoimento de uma testemunha referindo que a autora é chamada de Khadijah, o acréscimo que a requerente pretende altera substancialmente todo o seu patronímico, porque acrescentaria não somente o apelido Khadijah, mas também os apelidos Challitaalamur no seu sobrenome, inferindo, à evidência, na cadeia do registro dos patronímicos de família.

O art. 57 da Lei 6.015/73 dispõe que "qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se mandado e publicando-se a alteração pela imprensa".

O princípio da imutabilidade do nome, que é a regra, só pode ser mitigado quando houver razões juridicamente relevantes e que não devam ser desconsideradas.

Conforme já referi noutros julgamentos, admite-se a relativização da imutabilidade do nome em favor da dignidade humana, concedendo ao requerente o direito de portar nome, v.g., que não o exponha a constrangimentos sociais, ou que corresponda à sua realidade familiar.

No caso, não estando presentes as hipóteses autorizadoras previstas no art. 57 da Lei dos Registros Públicos para a modificação do nome da autora na forma pretendida, não se caracterizando a conversão aos costumes muçulmanos em situação excepcional que justifique a inclusão dos apelidos pretendidos pela apelante, o pleito não carece de ser acolhido.

Nesse sentido são os precedentes desse Tribunal:

"REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS. RETIFICAÇÃO DE ASSENTO DE NASCIMENTO DE MENOR. SOBRENOME SEM ERRO DE GRAFIA OU PASSÍVEL DE CAUSAR EMBARAÇO À INTERESSADA. PREFERÊNCIA DOS GENITORES QUE NÃO JUSTIFICA A MODIFICAÇÃO. PRINCÍPIO DA IMUTABILIDADE DO NOME. POSSIBILIDADE DA INTERESSADA, APÓS A MAIORIDADE, POSTULAR A RETIFICAÇÃO, CONFORME SEU DESEJO. EXCEÇÕES PREVISTAS NA LEI DOS REGISTROS PÚBLICOS (LEI Nº 6.015/73). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA, POR MAIORIA." (Apelação Cível Nº 70036482321, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Julgado em 22/07/2010).

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DO REGISTRO CIVIL. SUPRESSÃO DO PATRONÍMICO MATERNO. A alteração do nome só pode ser permitida de forma excepcional e justificada. Se o nome não provoca prejuízo, nem expõe a pessoa ao ridículo, não é caso para retificação. A rejeição e o abandono paterno não configuram a excepcionalidade exigida pela Lei dos Registros Públicos. NEGADO PROVIMENTO AO APELO." (Apelação Cível Nº 70033434838, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 29/04/2010).

Isto posto, nego provimento à apelação.

DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA (REVISOR) - De acordo com o Relator.

DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) - De acordo com o Relator.

DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL- Presidente - Apelação Cível nº 70039794748, Comarca de Carazinho: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

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