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24 de Outubro de 2011

Jurisprudência TJ-MG - Apelação Cível - Direito de família - Divórcio - Sucessão - Comunhão universal de bens - Herança

EMENTA

Apelação Cível - Direito de Família - Divórcio - Sucessão - Comunhão Universal de Bens - Herança - Meação - Impossibilidade - Sucessão aberta após a Separação de Fato - Pensão Alimentícia - Postulação pelo Cônjuge Varão - Possibilidade - Mútua Assistência - Princípio da Solidariedade - Ausência de prova da necessidade e da Possibilidade. Se, ao tempo da abertura da sucessão, o casal já estiver separado de fato, a herança recebida por um deles não se comunica, ainda que o regime seja o da comunhão parcial de bens. É cabível o pagamento de alimentos entre marido e mulher em virtude do dever de mútua assistência, bem como do Princípio da Solidariedade, balizador da obrigação alimentar entre os cônjuges. Nos termos do §1º do art. 1.694 do Código Civil, os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. Não se afigura razoável que, após longo período de separação de fato, venha o ex marido, sob o argumento de que não pode sobreviver às próprias custas, pleitear pagamento de pensão alimentícia à ex mulher, mormente, se não demonstrou, de forma contundente, a sua necessidade de receber tal verba, bem como a possibilidade dela de suportá-la. (TJMG - Apelação Cível nº 1.0701.09.266467-4/001 - Uberaba - 4ª Câmara Cível - Rel. Des. Dárcio Lopardi Mendes - DJ 24.11.2010)

ACÓRDÃO

(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador ALMEIDA MELO , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 11 de novembro de 2010.
DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES - Relator.

RELATÓRIO

O SR. DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES (Relator):
Trata-se de Apelação Cível interposta por P.R.M.F. contra a decisão de fls. 264/268, proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Uberaba/MG, que, nos autos da "Ação Divórcio Litigioso c/c Alimentos", ajuizada em desfavor de A. A. dos S. F., decretou o divórcio direto das partes, com fundamento no artigo 1.580, §2º, do Código Civil, e julgou improcedentes os pedidos de partilha, divisão de rendas e alimentos formulados na inicial. Autorizou o cônjuge Virago a voltar a usar o nome de solteira.
Em suas razões (fls. 270/277), alega, em apertada síntese, que o MM. Juiz não teria examinado criteriosamente as provas do processo e do conjunto de todos os atos praticados, bem como dos fatos e circunstâncias constantes dos autos; que a apelada "usou de prova testemunhal dirigida para obter a impressão de que foi vítima de coação por parte do Apelante, que supostamente a teria coagido a um aborto, motivo da separação de fato"; que teria restado demonstrado nos autos que a apelada encontra-se na administração dos bens do casal, usufruindo livremente dos mesmos sem lhe pagar qualquer renda; que passa por necessidades prementes, estando "gravemente enfermo", conforme documento de fl. 61; que sua necessidade de alimentos é patente, uma vez que conta com 67 anos de idade, não tem aposentadoria, tampouco possibilidade de retornar ao mercado de trabalho; que teria partido da apelada a iniciativa da separação de fato, ao abandonar o domicílio conjugal.
Intimada, a apelada apresentou contrarrazões às fls. 281/292.
A douta Procuradoria Geral de Justiça entendeu desnecessária a sua intervenção no feito.
Ausente o preparo recursal, eis que o apelante litiga sob o pálio da Justiça gratuita.
Assim, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

VOTO
Compulsando os autos verifica-se que as partes contraíram matrimônio, sob o regime de comunhão universal de bens, no dia 27/01/1962, conforme Certidão de Casamento acostada à fl. 33, sendo que, da união nasceram 02 (dois) filhos, ambos maiores.
Quanto à decretação do divórcio do casal, constata-se que não há qualquer controvérsia, sendo esta, tão somente, em relação à partilha dos bens, bem como dos alimentos pleiteados pelo cônjuge Varão.
Os bens a que se refere o apelante são os que, segundo consta dos autos, foram deixados pelos genitores e irmão da apelada (G. C. S. (mãe), F. S. dos S. (pai) e P. P. S. (irmão), dependentes da conclusão dos respectivos inventários, pois, ao tempo da separação, o casal não possuía qualquer bem.
Sustenta o apelante, inicialmente, que estaria separado de fato da apelada há 19 anos, e que, por este motivo, faria jus à meação dos bens que se encontram, hoje, em poder da ex mulher. Entretanto, da análise de todo o conjunto probatório, constata-se que, em verdade, o casal encontra-se separado há mais de 40 (quarenta) anos.
Das seis testemunhas arroladas pelas partes, quatro prestaram depoimento confirmando o lapso temporal de 42 anos de separação de fato do casal, senão vejamos:
Que conhece as partes há uns 45 anos, aproximadamente; que estima que as partes estejam separadas de fato 42 anos; isto porque quando a ré deixou o lar comum estava grávida do 2º filho, e o referido filho conta com 42 anos de idade; que não sabe informar se as partes em algum momento se reconciliaram; que não sabe informar se ao tempo do falecimento dos pais e irmão da ré as partes estavam separadas, porque era vizinha da casa da mãe do autor e não tinha contato com a família (...) (Testemunha S. A. M. - fl. 213 - grifo nosso)
Que conhece a ré desde a infância, tendo conhecido o autor apenas de vista, após a separação; que estima que o casal esteja separado há uns 43 anos aproximadamente, tendo em vista que na ocasião o dependente devia contar com 12 anos de idade; que quando se separaram, a ré foi residir na companhia dos pais dela na rua Monte Carmelo, sabendo do fato porque o depoente era vizinho dela; que pelo que sabe não houve reconciliação entre as partes após a separação; que após a separação viu o autor algumas vezes na casa dos pais da ré e, muito embora não saiba dizer o motivo das visitas sabe que discutiam bastante, isto porque o depoente era irmão do irmão da ré... (Testemunha O. F. L. F. - fl.214 - grifo nosso)
Que conhece a família há uns 50anos, tendo em vista que foi deles vizinha; que conheceu o autor apenas de vista; que sabe as partes estão separadas há 42 anos tendo como referência que o filho comum tem 42 anos; que não se recorda se a separação ocorreu antes ou após o nascimento do 2º filho, todavia quando ela foi residir com os pais dela, o referido filho era bem pequenininho, tendo em vista que saiu do hospital e foi direto do hospital para a casa; (...) (Testemunha Z. R. B. - fl.215 - grifo nosso)
(...) que conhece a ré desde a infância; que a ré foi morar após o casamento com a sua sogra; que faz 42 anos que a ré se separou, sabendo fato porque quando houve a separação ela ainda estava grávida do filho mais novo que atualmente tem 42 anos; que após a separação as partes não votaram a viver juntas em nenhum momento; que após a separação a ré foi residir na Rua Monte Carmelo, na companhia seus pais; que o autor costumava ir até a casa da ré visitar os filhos, todavia não entrava na residência (...) (Informante B. O. M. - fl.216 - grifo nosso)
Além disso, o próprio apelante informa em suas declarações que "ao que se recorda quando houve a separação, salvo engano apenas a mãe da ré já havia falecido", o que afasta a tese defendida de que a separação do casal havia ocorrido há 19 (dezenove) anos, pois, conforme salientado pelo douto sentenciante, "(...) ainda que verdadeira fosse a informação do autor, de se ver que o pai da autora faleceu em 1986, portanto, apenas por este fato, verifica-se que a informação contida na inicial não condiz com a verdade, conquanto apenas entre a data do falecimento e o ajuizamento da ação transcorreram 23 anos" (sic - fl. 266).
Entretanto, o conjunto probatório demonstra que nem uma nem outra data, a separação de fato se deu há mais de 40 (quarenta) anos.
Sendo assim, considerando que a abertura da sucessão dos genitores e do irmão da apelada ocorreu em momento posterior à separação de fato do casal, ou seja, depois de decorrido o lapso temporal de mais de 40 (quarenta anos), ainda que o regime adotado tenha sido o da comunhão universal de bens, não há que se falar em partilha de bens, oriundos de herança.
Nesse sentido, a jurisprudência do Colendo Superior tribunal de Justiça:
DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. SUCESSÃO. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. INCLUSÃO DA ESPOSA DE HERDEIRO, NOS AUTOS DE INVENTÁRIO, NA DEFESA DE SUA MEAÇÃO. SUCESSÃO ABERTA QUANDO HAVIA SEPARAÇÃO DE FATO. IMPOSSIBILIDADE DE COMUNICAÇÃO DOS BENS ADQUIRIDOS APÓS A RUPTURA DA VIDA CONJUGAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Em regra, o recurso especial originário de decisão interlocutória proferida em inventário não pode ficar retido nos autos, uma vez que o procedimento se encerra sem que haja, propriamente, decisão final de mérito, o que impossibilitaria a reiteração futura das razões recursais. 2. Não faz jus à meação dos bens havidos pelo marido na qualidade de herdeiro do irmão, o cônjuge que encontrava-se separado de fato quando transmitida a herança. 3. Tal fato ocasionaria enriquecimento sem causa, porquanto o patrimônio foi adquirido individualmente, sem qualquer colaboração do cônjuge. 4. A preservação do condomínio patrimonial entre cônjuges após a separação de fato é incompatível com orientação do novo Código Civil, que reconhece a união estável estabelecida nesse período, regulada pelo regime da comunhão parcial de bens (CC 1.725) 5. Assim, em regime de comunhão universal, a comunicação de bens e dívidas deve cessar com a ruptura da vida comum, respeitado o direito de meação do patrimônio adquirido na constância da vida conjugal. 6. Recurso especial provido. (STJ. RESP nº 555771. Ministro Luis Felipe Salomão. Quarta Turma. Julgamento: 05/05/2009. Publicação: 18/05/2009. Grifos nossos)
Quanto ao pedido de alimentos, inicialmente, cumpre ressaltar que é cabível o pagamento de alimentos entre marido e mulher, em virtude do dever de mútua assistência, bem como o princípio da solidariedade, balizador da obrigação alimentar entre os cônjuges, devendo estes ser fixados em consonância com a capacidade do alimentante e a necessidade daquele que pleiteia a pensão alimentícia.
Sobre o dever de prestar alimentos, reza o artigo 1.694, caput, do Código Civil Brasileiro:
Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação".
Nesse sentido, é de se notar que tanto o parentesco, como o matrimônio e a união estável são fontes de obrigação alimentar, mas, desde que na situação concreta concorram os pressupostos ditados na lei.
No caso do matrimônio e da união estável, a obrigação de alimentar decorre do dever de mútua assistência entre os cônjuges, incumbindo a cada um em relação ao outro, o dever de ajudá-lo economicamente. Trata-se, assim, de uma obrigação de dar, abrangendo o sustento e outras prestações econômicas, inclusive a prestação de alimentos.
Já o §1º do citado artigo estabelece que os alimentos devem ser fixados "na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada", o que significa dizer que, o alimentado tem o direito de receber o necessário ao seu sustento, mas sempre dentro do razoável, e com especial atenção à necessidade de quem pede e possibilidade do obrigado.
Assim, é necessário que se alcance um equilíbrio, através do qual, o alimentado não receberá mais do que precisa, nem o alimentante será obrigado a pagar além do que suas condições econômicas permitam, adequando, assim, o prestação alimentar ao quadro real vivenciado pelos envolvidos.
No presente caso, embora o apelante tenha sustentado a sua necessidade, afirmando ser "idoso e se encontra doente, auferindo renda de apenas um salário mínimo de sua aposentadoria, encontrando-se em situação de penúria (...)", fato é que, não se desincumbiu do ônus de comprovar que sua ex mulher, de quem está separado de fato há mais de 40 (quarenta) anos, tenha possibilidade de arcar com uma pensão alimentícia em seu favor no montante de R$3.000,00 (três mil reais), ou em qualquer outro valor.
Como cediço, o ônus da prova incumbe, ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, conforme a regra expressa do artigo 333 do Código de Processo Civil.
Logo, não se afigura razoável que, após longo período de separação de fato, venha o ex marido, sob o argumento de que não pode sobreviver às próprias custas, pleitear o pagamento de pensão alimentícia, mormente porque o mesmo embasou seu pedido apenas em meras alegações, que não possuem valor probatório capaz de outorgar ao julgador a convicção necessária para agasalhar o seu pedido.
Ressalte-se, por oportuno, que o instituto dos alimentos visa a proteger os necessitados, e não a fomentar a ociosidade. Por tal razão, somente fará jus ao seu recebimento quem demonstrar a necessidade de perceber auxílio para sobreviver.
Além de não ter sido produzida qualquer prova que demonstre que o apelante necessita dos alimentos, deve-se ponderar, ainda, que o simples fato de ter sobrevivido, até então, sem pensão da ex mulher, por si só, já demonstra a desnecessidade de se impor o dever à apelada. Acrescente-se que não foi demonstrada qualquer queda ou alteração na renda do apelado que justificasse o surgimento da necessidade de perceber alimentos.
Portanto, sendo precária e inconsistente a prova da necessidade do cônjuge, assim como da possibilidade da alimentante em pagar a pensão, outra não poderia ser a solução para a lide senão aquela encontrada pelo ilustre Magistrado de primeiro grau que, acertadamente, julgou improcedentes os pedidos contidos na exordial.
Observe-se que o apelante pleiteou alimentos depois de rompido o vínculo entre as partes, ou seja, após anos de separação de fato, não obstante o divórcio ainda não ter sido formalizado na Justiça.
Assim, não havendo provas contundentes acerca da necessidade do ex cônjuge Varão, ora apelante, bem como das possibilidades da apelada, tenho que a sentença primeva não merece qualquer reparo, também, neste ponto.
Mediante tais considerações, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO, mantendo inalterado o decisum objurgado.
Custas recursais, pelo apelante, ficando suspensa a exigibilidade em razão de litigar sob o pálio da Justiça gratuita.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): HELOISA COMBAT e ALMEIDA MELO.
SÚMULA: NEGARAM PROVIMENTO.

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