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16 de Janeiro de 2012

Jurisprudência TJ-SP - Ação de anulação de testamento - Improcedência - Insurgência dos herdeiros necessários

EMENTA

Ação de anulação de testamento " Improcedência " Insurgência dos herdeiros necessários " Elementos indicativos demonstrando que o testador não estava em sua plena capacidade de manifestar o seu desejo " Esquizofrenia atestada que levava à incapacidade mental " Sentença reformada para decretar a nulidade do testamento. Apelo provido. (TJSP " Apelação Cível nº 9150475-68.2007.8.26.0000 " São Paulo " 10ª Câmara de Direito Privado " Rel. Des. Octavio Helene " DJ 19.07.2011)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação nº 9150475-68.2007.8.26.0000, da comarca de SÃO PAULO - FAMÍLIA, em que são apelantes ANTÔNIO CARLOS BRINCO, MARIA DE FÁTIMA BRINCO e ANA MARIA BRINCO sendo apelados MAURÍCIO FARIA DA SILVA, ARNALDO FARIA DA SILVA e MITRA ARQUIDIOCESANA DE SÃO PAULO PARÓQUIA SANTA RITA DE CÁSSIA.
ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do tribunal de justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO, VENCIDO O RELATOR SORTEADO. ACÓRDÃO COM REVISOR. DECLARARÁ VOTO O RELATOR", de conformidade com o voto do(a) relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos desembargadores MAURÍCIO VIDIGAL (presidente sem voto), OCTAVIO HELENE E COELHO MENDES.

São Paulo, 9 de novembro de 2010.
TESTA MARCHI " Relator designado.

RELATÓRIO

A r. sentença de fls. 416/425 julgou improcedente a ação de anulação de testamento ajuizada pelos apelados, por entender o MM. Juiz que os autores não trouxeram elementos suficientes para caracterizar a nulidade pretendida.

Apelam os autores, pleiteando a reversão do julgado, sob fundamento de que seu pai não tinha condições de fazer seu testamento e dispor de seus bens, já que ele apresentava quadro psicótico, com alucinações, delírios místicos e histeria religiosa, devendo ser declarado nulo o ato por ele praticado.

Contrarrazões as fls. 478/498, 500/513 e 515/532.

A d. Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo parcial provimento (fls. 541/542).

É o relatório.

VOTO
DES. TESTA MARCHI " (Relator Designado):

1. O recurso comporta acolhimento.
Anota-se que, com o acolhimento do agravo retido, o julgamento anterior foi convertido em diligência para a oitiva da testemunha Humberto Luiz Silveira, o que foi feito às fls. 581 e seguintes.

Restou suficientemente demonstrado que, por ocasião do testamento, o falecido Carlos Augusto Mendes Brinço estava acometido de delírios e alucinações.

A declaração de fls. 252, firmada pelo médico neurocirurgião, Dr. Paulo Roberto Silveira, que atendia o testador, afirmou que ele apresentava episódios de delírios místicos, alucinações, síndromes perseguitórias, falava com os santos de sua devoção, além de outras anomalias, diagnosticando que ele estava acometido de esquizofrenia.
A doação não foi feita a parentes, mas sim à Paróquia Santa Rita de Cássia. Ainda que não se possa dizer que houve captação dolosa, sendo o testador católico fervoroso, não está fora de cogitação que os demandados tenham cooperado para o resultado, como reconhece a própria sentença.

As provas reunidas também indicam que a doação do patrimônio disponível para a Paróquia, teria decorrido de descontentamento e mágoa com a família, assim como em função de graça alcançada por problemas de saúde (fls. 135, 353 e 355/356).

As testemunhas inquiridas às fls. 342/343, 344/345 e 346/347, ainda que ouvidas como informantes, mencionaram "...que o autor da herança desde há muito conversava com santos...", "...que falava coisas desconexas...", "...que dizia que uma voz o mandava procurar um vilarejo em Portugal para falar com uma determinada santa...", "...que ele já tinha ido até aquela localidade cumprindo o que a voz lhe determinava e que ficou muito satisfeito com a viagem..." "...que ele vivia distribuindo santinho de São Judas para as pessoas...", "... que para o testador só existia a igreja católica ou o diabo e que ele dizia ver o capeta...".

A testemunha Humberto Luiz Silveira (fls. 581/586), médico que atendia o paciente, confirmou que o testador era portador de várias moléstias, evoluindo para um quadro psiquiátrico de histeria religiosa "...a ponto de confidenciar ao depoente que falou com santos em especial São Judas Tadeu...", "... que o falecido parecia apresentar quadro esquizotímico com alucinações auditivas e visuais..." "...havia relato de que ele via figuras religiosas e satânicas...", "...o quadro psicológico contribuía para o entendimento irreal das coisas..." "...nos últimos anos de vida o falecido não se encontrava em perfeito juízo havendo comprometimento do entendimento da realidade...".

2. Se não foi feita prova em contrário, baseada no laudo indireto consignado pelo médico que atestou a esquizofrenia, é de ser admitida a incapacidade, se as testemunhas, inclusive o facultativo que o tratava, confirmaram a alienação mental. Note-se que no testamento (fl. 98/99), sequer foram descritos os bens doados, consignando-se que ele dispunha de 50% de sua parte disponível, que corresponde à metade dos bens à Paróquia Santa Rita de Cássia, constatando-se que as disposições foram obscuras, não motivadas por razões de amizade, afeição, solidariedade ou amparo, mas sim beneficiando entidade religiosa em prejuízo dos herdeiros necessários, o que demonstra que o testador, em razão de suas visões místicas, não estava pleno de sua capacidade quando dessa disposição, ainda que respeitado os quinhões reservados aos herdeiros necessários.

3. Desta forma é nulo o testamento se o testador, ao praticar o ato, não estava em seu juízo perfeito, sendo que as características da enfermidade tornam verossímeis a hipótese de anormalidade psíquica, não prevalecendo em contrário a declaração inserta pelo Tabelião na cédula, contrariada pela prova técnica e testemunhai de que o testador se achava no gozo de suas faculdades mentais.

Observe-se que para a incapacidade testamentária basta que a pessoa não esteja em seu juízo perfeito.

Ensina a propósito, Pontes de Miranda:

"Ato de extraordinária significação que é o testamento, estatui-se que só o podem fazer os que estão em perfeito juízo. Não só os loucos, os menores de 16 anos e os surdos-mudos, que não podem manifestar a sua vontade, como também aqueles, sãos, maiores de idade referida, que ocasionalmente não podem ser cridos em discernimento, em inteira capacidade de deliberar. Os dois casos típicos são a embriaguez e a ira. Ora, se até estados eventuais e passageiros, como a embriaguez e a ira, bastam, de acordo com a lição, para por o testador fora de seu perfeito juízo, a fortiori situações de confusão mental duradouras e progressivas, do tipo da que caracteriza a enfermidade diagnosticada no caso".

4. Destarte, a fim de corrigir distorções quanto a forma obscura ou confusa do testador, e visando proteger o direito dos seus herdeiros, que são seus filhos, existindo nos autos elementos indicativos de que ele não estava em sua plena capacidade de manifestar o seu desejo, impõe-se a nulidade do ato, eis que as visões fantasiosas levaram à lassidão da sua vontade, sendo causa suficiente para ensejar a ineficácia do testamento eis que a sua manifestação volitiva não foi livre mas fruto de espectro delirante, qual seja, de visão de figura imaterial imaginária que povoou o seu pensamento e que desencadeou a ação, exageração patológica que leva ao acolhimento da pretensão recursal.

5. Ante o exposto, dá-se provimento ao apelo para decretar a nulidade do testamento, arcando os apelados com as custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios que ficam arbitrados em R$ 5.000,00, com fundamento no § 4º, do artigo 20 do Código de Processo Civil, tendo em vista o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação, a natureza e importância do feito, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

TESTA MARCHI " Desembargador Relator Designado.

DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
DES. OCTAVIO HELENE (Relator):

1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra r. sentença que, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Testamento com pedido liminar, julgou improcedente a ação. Inconformados, recorrem os autores, buscando, preliminarmente, o conhecimento do agravo retido interposto em audiência de instrução realizada em 24 de abril de 2007, contra r. decisão do d.Juiz que dispensou a oitiva da testemunha Humberto Luiz Silveiro, médico (fls.337/338 e fls.340/341), sob o fundamento de que o d.Juiz antecipou o conteúdo de depoimento do qual sequer teve conhecimento, qualificando-o como técnico e precluso. No mérito, requerem os autores a nulidade de todas as disposições testamentárias, sob o fundamento de que estas estão inquinadas de vícios. Sustentam os apelantes, que o testador efetuou doação inoficiosa, por ter disposto da totalidade de seus bens sem resguardar a legítima dos herdeiros necessários, porque doou à ré Mitra Arquidiocesana de São Paulo a totalidade da meação que lhe cabia no patrimônio, legando além do que poderia dispor do seu disponível. Alegam ainda que, quando da liberalidade o testador sofria de esquizofrenia paranóide, motivo pelo qual apresentava episódios relativamente freqüentes de visões de personalidade satânica que lhe fazia constantes ameaças quanto ao seu destino pós-morte, principalmente com promessas punitivas no inferno, causando-lhe inúmeras vezes grande pânico e ansiedade, ou seja, o testador estava acometido de doença mental; do que se conclui que não possuía pleno discernimento para se manifestar livremente e dispor de seus bens. Sustentam ainda que houve captação dolosa efetivada pelos membros e representantes da herdeira instituída.

Depreende-se dos autos que Antônio Carlos Brinco, Maria de Fátima Brinco e Ana Maria Brinco, filhos do testador Sr. Carlos Augusto Mendes Brinco, promoveram a presente ação, em face de Mitra Arquidiocesana de São Paulo - Paróquia Santa Rita de Cássia (beneficiária do aludido testamento). Arnaldo Faria da Silva e Maurício Faria da Silva (testamenteiros nomeados pelo autor da herança), foram incluídos no pólo passivo por determinação de fl.100. Posteriormente às alegações finais houve manifestação do Ministério Público do Estado de São Paulo às fls.408/414 e às fls.536/537. Às fls.541/542 foi acostado parecer da d. Procuradoria Geral de Justiça, opinando pelo desprovimento do agravo e pelo provimento parcial da apelação para atender ao princípio da intangibilidade da legítima dos herdeiros necessários.

2. O agravo retido foi acolhido por unanimidade de votos por esta Colenda Câmara (fls.553/569), convertendo-se o julgamento em diligência para a produção da prova faltante, isto é, para oitiva da testemunha Humberto Luiz Silveira que fora indicado como Assistente Técnico pelos autores. Mencionada testemunha foi ouvida pelo Juízo "a quo" às fls.578/587, sendo que o d.Juiz manteve as decisões proferidas anteriores por seus próprios fundamentos. A produção da prova oral, ora realizada teve por objetivo a busca da verdade real, notadamente, levando-se em conta a natureza peculiar da causa.

Contudo, as assertivas do Sr. Humberto Luiz Silveira não alteraram o convencimento deste Relator, porque nenhum dado novo e relevante foi acrescido ao processo. Afirmou o Sr. Humberto Luiz Silveira, na qualidade de médico da família, que o inventariado "parecia apresentar um quadro esquizotímico além de histeria religiosa apresentando alucinações auditivas e visuais". Tal afirmativa já consta dos autos. Ademais, o médico não diagnosticou ausência de higidez mental por parte do inventariado. Assim, fica inalterado meu convencimento acerca da situação examinada neste recurso. A d. Procuradoria Geral de Justiça, em face da oitiva da testemunha, manifestou-se mantendo o parecer de fls.541/542.

Em primeiro, no que tange a alegação de incapacidade mental do testador, os autores trouxeram ao processo apenas declaração do médico Dr. Paulo Roberto Siqueira, neuropsiquiatra (fl.252) que atendeu o testador em algumas ocasiões, diagnosticando a esquizofrenia, posteriormente, à morte do "de cujus". Ocorre que, o d.Juiz determinou, por duas vezes, que os autores juntassem o prontuário médico em poder do referido médico para realização da devida perícia técnica pelo IMESC, a qual seria apta a comprovar a capacidade de testar do autor da herança (fls.289 e 291), não obstante, permaneceram inertes, o que inviabilizou a obtenção do laudo pericial, tendo sido declarada preclusa a produção de tal prova a fl.292. No mais, dispõe o artigo 436 do CPC que: "O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos".

Aos autores cabia comprovar a anormalidade do estado mental do testador quando ele praticou o ato. Permanecendo a dúvida ou não tendo sido ela comprovada de forma irrefutável, a ação merecia mesmo a improcedência. Vale ressaltar, mais uma vez que, a higidez mental sempre se presume, enquanto a anormalidade deve ser demonstrada.
Destarte, os prontuários médicos acostados por cópia aos autos às fls.48, 62 e 65 do Hospital e Maternidade Modelo, onde o testador permaneceu internado por três dias, não fazem menção a quadros de alucinação ou transtornos psicóticos, como asseveram os apelantes, mas, à isquemia cerebral, ou Acidente Isquêmico Transitório, mais comumente conhecido como "pequeno derrame cerebral".

As testemunhas ouvidas às fls.352/354 e fls.355/356 que acompanharam a leitura do testamento, outra coisa não afirmaram. Quando de suas oitivas não mencionaram que o testador estaria impossibilitado de manifestar sua vontade, não obstante, estivesse com problemas de saúde. Ao contrário, as testemunhas apenas declararam que o Sr. Carlos Augusto Mendes Brinco era pessoa religiosa e que apesar de seu frágil quadro de saúde, preservava sua capacidade de raciocínio e discernimento. E como consta dos laudos médicos acostados aos autos às fls.62 e 65 até mesmo quando o testador esteve internado por ter sofrido um acidente vascular cerebral (AVC), antes da lavratura do testamento, não foram encontrados registros de período de confusão mental, ao contrário disso, ou seja, de que aquele permaneceu consciente, calmo e orientado.
O que se colhe dos depoimentos das testemunhas é que todas relatam que o testador sofria com problemas de saúde, no entanto, nenhuma delas sequer mencionou que aquele estivesse com insuficiência mental ou incapaz de expressar sua vontade livremente.

Em segundo, pesem os argumentos sustentados pelos apelantes, a afirmada captação dolosa, da mesma forma, não se evidenciou. Conquanto sustentam os apelantes que as disposições testamentárias foram elaboradas por técnicos (escrevente notarial e advogado), que tinham conhecimento da manifesta afronta a dispositivo legal e que todos que participaram de alguma forma do ato eram pessoas diretamente ligadas à herdeira instituída, o fato é que não se comprovou que o testador foi coagido a praticar o ato de liberalidade combatido através da presente ação, mesmo porque, prova irrefutável de sua incapacidade mental não foi produzida nos autos. O fato de a apelada ter se habilitado como credora no inventário do testador de um cheque no valor de R$ 147.000,00, emitido pelo autor da herança durante o período em que estava sendo elaborado o testamento, por si só, não se revela apto a configurar a mencionada captação dolosa, até porque a ré afirma ter tentado descontar o cheque através de instituição bancária e não logrou êxito, razão pela qual habilitou-se nos autos de inventário do testador.

A captação, em si mesma, ou a captação que se exerce sem recurso de manobras ou artifícios fraudulentos, é um fenômeno ordinário e comum não alcançado pela censura da lei. Do que consta dos autos, não se pode aferir com certeza tivesse ocorrido vício de forma quando da lavratura do testamento. No mais, a captação só conduz à nulidade do ato da espécie em exame quando dolosa, o que não se evidenciou nos presentes autos. Este Tribunal já decidiu quanto ao dolo na matéria em exame, como sendo o "resultado do induzimento em erro, feito maliciosamente. Sua prática, pois, leva por escopo ilaquear o conhecimento do paciente a ele submetido, a fim de que profira uma expressão volitiva que repouso em supostos falsos" (RJTJESP - LEX - 118/248).

A incapacidade mental do testador não restou provada, de forma convincente e isenta de dúvidas, devendo prevalecer, por isso, a presunção legal da existência de capacidade plena. Prova cabal e irrefutável quanto à capacidade para testar não foram vertidas dos autos. Assim, nos termos em que posta a demanda, a alegada incapacidade nem de longe se positivou, de modo que a improcedência da ação era de rigor.

Nesse sentido, há muito já decidia o Colendo Supremo Tribunal Federal:
"A insanidade mental do testador que causa a anulação do testamento tem de ser provada inequívoca e completamente, pois a capacidade é sempre presumível" (STF - RE. N.21.7321 - 1a Turma " Relator Ministro Luis Galliotti, p.2934).

Colaciono jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido:
"II - Em matéria testamentária, a interpretação volta-se, sempre, no intuito de fazer prevalecer a vontade do testador, a qual deverá orientar, inclusive, o magistrado quanto à aplicação do sistema das nulidades, que apenas não poderá ser mitigado, diante da existência de fato concreto, passível de colocar em dúvida a própria faculdade que tem o testador de livremente dispor de seus bens, o qual se faz ausente nos autos" (STJ - AgRg no Agravo de Instrumento n° 570.748 - SC (2003/0231929-2), Relator Ministro Castro Filho).

Em terceiro, quanto às disposições de última vontade, estas não podem exceder a legítima dos herdeiros necessários, a teor do que dispõe o artigo 1877,§ 1º, do Código Civil, atendendo ao princípio da intangibilidade da legítima dos herdeiros necessários. No caso em exame, o testador ao legar à ré - Mitra Arquidiocesana de São Paulo -, a totalidade dos seus bens, aparentemente, invadiu a legítima dos herdeiros necessários, conforme se verifica da cláusula testamentária a qual trago à colação (fls.42/43):

"Que, embora tenha herdeiros necessários nas pessoas de seus filhos, pode, conforme lhe faculta a Lei, dispor até 50% (cinqüenta por cento) da totalidade de seus bens, já que os outros 50% do patrimônio do casal pertencem a sua esposa por direito de meação. - Que assim, usando dessa faculdade, institui herdeira de sua parte disponível, que corresponde a metade se seus bens, a Paróquia Santa Rita de Cássia, inscrita no CNPJ sob o n° 63.089.825/0175-43, sediada nesta Capital, na Praça Santa Rita de Cássia n° 133, bairro de Mirandópolis."

A uma primeira leitura da aludida cláusula, pode parecer que o testador não preservou a legítima dos herdeiros, senão vejamos: "Que, embora tenha herdeiros necessários nas pessoas de seus filhos, pode, conforme lhe faculta a Lei, dispor até 50% (cinqüenta por cento) da totalidade de seus bens, já que os outros 50% do patrimônio do casal pertencem a sua esposa por direito de meação", o que, em princípio, afrontaria a legítima dos herdeiros, mas , continua o testamento: "Que assim, usando dessa faculdade, institui herdeira de sua parte disponível, que corresponde a metade se seus bens, a Paróquia Santa Rita de Cássia, inscrita no CNPJ sob o n° 63.089.825/0175-43, sediada nesta Capital, na Praça Santa Rita de Cássia n° 133, bairro de Mirandópolis", desta forma, resta claro que a intenção do testador era a de legar apenas o seu disponível, não havendo que se falar em nulidade de testamento. De fato, o testador, possuindo herdeiros necessários, só poderia ter disposto da metade de seus bens - parte disponível -, pois a outra metade é a legítima, a quota do patrimônio destinada, obrigatoriamente, a esses herdeiros forçados, não podendo o testador extrapolar os limites estabelecidos no artigo 1789 do Código Civil, excedendo ao que poderia dispor em testamento.

Os herdeiros necessários não podem ser privados da legítima. Se a quota disponível deixada a terceiros ultrapassar o limite de 50%, afetando a legítima, os herdeiros podem pleitear a redução das disposições testamentárias como autorizam os artigos 1967 e 1968 do Código Civil.

No entanto, aqui, não é caso de anulação do testamento ou e cláusula testamentária, mas de apenas transferência de bens da quota disponível para a legítima, através da redução das disposições testamentárias. Assim, tendo os três herdeiros necessários pleiteado a redução das disposições testamentárias, de rigor que seja recomposta a legítima dos herdeiros que requereram a sua adequação, reduzindo-se a disposição testamentária à ré Mitra Arquidiocesana de São Paulo - Paróquia Santa Rita de Cássia, até resguardar a legítima dos herdeiros necessários, observados os critérios estabelecidos no art.1967 e parágrafos do Código Civil. Quanto a esse ponto, do mesmo modo, não merece reparo a r. sentença recorrida.

Em suma, tendo os autores deixado precluir o direito de apresentar documento hábil à aferição da alegada incapacidade mental do testador quando da feitura do testamento; considerando que, as provas constantes dos autos outra coisa não comprovaram e ainda, privilegiando o princípio do livre convencimento fundamentado do Juiz, já que a higidez mental é presumida, enquanto a incapacidade deve ser comprovada, fica mantida a r. sentença, nesse aspecto. No mais, não é hipótese de anulação de testamento de fls.141/142, mas de simples redução das disposições testamentárias, como determinado na r. sentença recorrida a fl.424. Assim, por qualquer ângulo que se examine a questão, há de prevalecer a vontade do testador, considerando válido o testamento por ele realizado.

Verba honorária fixada com critério, até porque beneficiários os apelantes da gratuidade processual.

Assim entendendo, pelo meu voto, nego provimento ao recurso de apelação, mantida a r. sentença da lavra do d.Juiz Roberto Caruso Costabile e Solimine, no que fiquei vencido.

OCTAVIO HELENE " Desembargador Relator.

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