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19 de Junho de 2012

Justiça de Tanabi autoriza casamento civil direto homoafetivo

PODER JUDICIÁRIO - SÃO PAULO

JUIZO DE DIREITO DA 2ª VARA DA COMARCA DE TANABI
CORREGEDORIA PERMANENTE


v i t o s.

Trata-se de procedimento administrativo de PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO DE CASAMENTO,
fundamentado no item 52 do Capitulo XVII das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, apresentado pelo Sr. Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de Tanabi, a requerimento de A. A. F. de O. e E. R. de L. A., solicitando autorização para casamento homoafetivo.

Vieram aos autos parecer do ministério Público, favorável ao pedido de casamento de pessoas do mesmo sexo.

É o RELATÓRIO.

Fundamento e DECIDO.

Como é cediço, o casamento homoafetivo, ou seja, casamento de pessoas do mesmo sexo, não possui amparo na legislação, contudo tem sido admitido pelos Tribunais, suprindo a lacuna da lei.

A união de pessoas do mesmo sexo (seja na forma de união estável, seja oriunda de casamento) é uma realidade social, e por isso merece proteção do estado.

Como bem ilustrado pela DD. Promotora de Justiça, ao colacionar decisões já proferidas pelos nossos Tribunais:

DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO (HOMOAFETIVO). INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.514, 1.523, 1.535 e 1.565 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO EXPRESSA A QUE SE HABILITEM PARA O CASAMENTO PESSOAS DO MESMO SEXO. VEDAÇÃO IMPLICÍTA CONSTITUCIONALMENTE INACEITÁVEL. ORIENTAÇÃO PRINCIPIOLÓGICA CONFERIDA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADPF N. 132/RJ E DA ADI N. 4.277/DF.

1. Embora criado pela Constituição Federal como guardião do direito infraconstitucional, no estado atual em que se encontra a evolução do direito privado, vigorante a fase histórica da constitucionalização do direito civil, não é possível ao Superior Tribunal de justiça analisar as celeumas que lhe aportam "de costas" para a Constituição Federal, sob pena de ser entregue ao jurisdicionado um direito desatualizado e sem lastro na Lei Maior. Vale dizer, o Superior Tribunal de Justiça, cumprindo sua missão de uniformizar o direito infraconstitucional, não pode conferir à lei uma interpretação que não seja constitucionalmente aceita.

2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto da ADPF n. 132/RJ e da ADI n. 4.277/DF, conferiu ao art. 1.723 do Código Civil de 2002 interpretação à Constituição para dele excluir todo significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família.

3. Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988 uma nova fase do direito de família, e consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado "família", recebendo todos eles a "especial proteção do estado". Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento - diferentemente do que ocorria com os diplomas superados - deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade.

4. O pluralismo familiar engendrado pela Constituição - explicitamente reconhecido em precedentes tanto desta Corte quanto do STF - impede se pretenda afirmar que as famílias formadas por pares homoafetivos sejam menos dignas de proteção do Estado, se comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais heteroafetivos.

5. O que importa agora, sob a égide da Carta de 1988, é que essas famílias multiformes recebam efetivamente a "especial proteção do Estado", e é tão somente em razão desse desígnio de especial proteção que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento, ciente o constituinte que, pelo casamento, o Estado melhor protege esse núcleo doméstico chamado família.

6. Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os "arranjos" familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar, independente de orientação sexual dos partípipes, uma vez que as famílias constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiologicos daquelas constituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto.

7. A igualdade e o tratamento isonomico supõem o direito a ser diferente, o direito à auto-afirmação e a um projeto de vida independente de tradições e ortoxas. Em uma palavra: o direito à igualdade somente se realiza com plenitude se é garantido o direito à diferença. Conclusão diversa também não se mostra consentânea com um ordenamento constitucional que prevê o princípio do livre planejamento familiar (§7° do art. 226). E é importante ressaltar, nesse ponto, que o planejamento familiar se faz presente tão logo haja a decisão de duas pessoas em se unir, com escopo de construir famílias, e desde esse momento a Constutuição lhes franqueia ampla liberdade de escolha pela forma em que se dará a união.

8. Os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento familiar.

9. Não obstante a omissão legislativa sobre o tema, a maioria, mediante seus representantes eleitos, não poderia mesmo "democraticamente" decretar a perda de direitos civis da minoria pela qual eventualmente nutre alguma aversão. Nesse cenário, em regra é o poder Judiciário - e não o Legislativo - que exerce um papel contramajoritário e protetivo de especialíssima importância, exatamente por não ser compromissado com as maiorias votantes, mas apenas com a leie com a Constituição, sempre em vista a proteção dos direitos humanos fundamentais, sejam eles das minorias, sejam das maiorias. Dessa forma, ao contrário do que pensam os críticos, a democracia se fortalece, porquanto esta se reafirma como forma de governo, não das maiorias ocasionais, mas de todos.

10. Enquanto o Congresso Nacional, no caso brasileiro, não assume, explicitamente, sua coparticipação nesse processo constitucional de defesa e proteção dos socialmente vulneráveis, não pode o poder judiciário demitir-de desse mister, sob pena de aceitação tácita de um Estado que somente é "democrático" formalmente, sem que tal predicativo resista a uma mínima investigação acerca da universalização dos direitos civis.

11. Recurso especial provido."

(SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 4° Turma, REsp 1183378/RS, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO).

Portanto, deve ser autorizado o casamento de pessoas do mesmo sexo, como fator de evolução das relações sociais e seu reflexo no direito, possibilitando o reconhecimento e o exercício da dignidade da pessoa humana, que não podem ficas à margem da sociedade cultural, preservando-se até mesmo direitos patrimoniais decorrentes desta união.

De qualquer modo, o fundamental é que as pessoas envolvidas no relacionamento tenham como objetivo a constituição da família, aplicando-se por analogia (no que couber) a legislação vigente.

Desta maneira, apenas a título de argumentação, os tribunais têm admitido até mesmo que pessoas do mesmo sexo que vivam em união homoafetiva adotem filhos. Mais como ilustra o Ministro Celso de Mello (STF), deve ser reconhecido o direito à diferença e o direito personalíssimo da pessoa.

Conclui-se, portanto, que a existência de uma nova configuração de família, que não obstante ser formada por pessoas do mesmo sexo biológico, mas ligada pelos laços de afetividade, merece reconhecimento pelo nosso ordenamento como entidade familiar. A união pelo amor é que caracteriza a entidade familiar e não apenas a diversidade de generos. E, antes disso, é o afeto a mais pura exteriorização do ser e do viver, de forma que a marginalização das relações mantidas entre pessoas do mesmo sexo constitui forma de privação do direito de vida, bem como viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade.


Ante o expoxto, AUTORIZO o casamento homoafetivo (desde que preenchidos os demais requisitos da legislação), dando a esta decisão caráter normativo para casos análogos.

p.r.i.c

Ciência desta decisão ao Oficial Registrador, para as providências legais. Custas "ex lege".

Tanabi, 20 de abril de 2012.

PAULO ROBERTO ZAIDAN MALUF
Juiz de Direito

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