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23 de Junho de 2006
Artigo - A Inaplicabilidade do CDC aos Serviços Notariais e Registrais (continuação)
2. A RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO NO CDC
O art. 22 do Código de Defesa do Consumidor trata da responsabilidade do poder público, tendo em vista que as pessoas jurídicas de direito público podem figurar no pólo ativo da relação de consumo, como fornecedoras de serviços.
Ocorre que o mencionado art. 22 do CDC faz remissão expressa às 'empresas públicas' concessionárias ou permissionárias de serviços públicos, entes administrativos com personalidade jurídica própria, senão vejamos:
-Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer outra forma de empreendimento,são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.- (grifo nosso)
No que pertine ao serviço notarial e de registro, o entendimento predominante de nossa doutrina e jurisprudência é de que os cartórios extrajudiciais, entes despersonalizados, desprovidos de patrimônio próprio, não possuem personalidade jurídica e não se caracterizam como empresa ou entidade.
Cumpre frisar que, hodiernamente, os serviços notariais e de registro passaram a ser delegados pelo Poder Público, por meio de concurso público, e exercidos, em caráter privado, consoante o disposto no art. 236 da Constituição Federal/88. Assim sendo, os cartórios extrajudiciais constituem, em decorrência de sua própria natureza, função revestida de estatalidade e sujeita, por isso mesmo, a um regime de direito público. Todavia, é preciso frisar que os notários e registradores não exercem cargo público, são classificados como agentes públicos delegados, os quais agem como se fossem o próprio Estado, dotados de autoridade (poder certificante da fé pública). O notário e o registrador exercem uma função pública delegada 'sui generis', exercida no interesse da sociedade e que têm o escopo de garantir a segurança jurídica, a paz social, o bem comum e o desenvolvimento econômico do País.
É certo afirmar que as serventias notariais e de registro não são pessoa jurídica " não são empresa. A afirmação torna-se inequívoca pela análise da relação jurídica existente entre o titular da Serventia e o Estado ou mesmo porque a organização é regulada por lei e os serviços prestados ficam sujeitos ao controle e fiscalização permanente do Poder Judiciário. Ainda, como já mencionado, o cartório não possui personalidade jurídica, a qual só se adquire com o registro dos atos constitutivos na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas.
Nesse sentido, REGNOBERTO MARQUES DE MELO JR., em obra intitulada - "Da Natureza Jurídica dos Emolumentos Notariais e Registrais" - pondera que:
"Vale ponderar de logo que os serviços notariais e registrais (cartórios) não possuem personalidade jurídica. São meras divisões administrativas nas quais os notários e registradores exercem o seu mister, através de delegação estatal. (..) É manifesto que não há atos praticados pelos serviços notariais e de registro.' Os serviços notariais e de registro não praticam atos. Quem os pratica, prescinde referir, são os notários e registradores e seus prepostos, contratados pelo regime celetista."12
Ainda, quanto à interpretação do art. 22 do CDC, pondera Zelmo Denari, in verbis:
-O art. 22 faz remissão às empresas ' rectius empresas públicas ' concessionárias de serviços públicos, entes administrativos com personalidade de Direito Privado."13
Com efeito, por todas as razões apresentadas, entende-se não estar incluso no parágrafo único, do art. 22 do CDC, o serviço público delegado pelo Estado à pessoa física do notário ou registrador. Ocorre que tal dispositivo legal abrange, exclusivamente, as empresas públicas, dotadas de personalidade jurídica própria, tais
como as concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
Por fim, ante a inaplicabilidade das regras gerais do Código de Defesa do Consumidor às atividades atípicas prestadas pelos cartórios, verifica-se que a responsabilidade do titular do serviço notarial e de registro é dotada de regulamentação 'específica', tendo em vista a previsão especial contida na Lei 8.935, de 18.11.1994, que regulamenta o art.236 da Constituição Federal. A Lei nº 8.935/94, disciplina a responsabilidade civil e criminal dos Notários, Oficiais de Registro, Tabeliães e de seus prepostos (Lei 8.935/94 - art. 22 e, 24). Por sua vez, cumpre frisar que, anteriormente, o art. 28 da Lei nº 6.015/73 já havia fixado a responsabilidade subjetiva dos Oficiais de Registro. Posteriormente, a Lei 9.492/97 consagrou, mediante o art. 38, a responsabilidade subjetiva dos tabeliães de protesto de títulos, os quais são pessoalmente responsáveis por todos os prejuízos causados, por dolo ou culpa, pelos substitutos designados ou escreventes autorizados, assegurado o direito de regresso. Portanto, conclui-se que a atividade notarial e de registro subordina-se à legislação especial, algumas promulgadas após o Código de Defesa do Consumidor.
CONCLUSÃO
O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor é um importante microssistema jurídico que visa harmonizar as relações de consumo, além de oferecer segurança e proteção aos consumidores hipossuficientes. Todavia, tais normas não podem ser aplicadas indistintamente, conforme verificou-se no desenvolvimento deste trabalho. Assim sendo, passamos a arrolar as principais conclusões:
1. A natureza jurídica dos emolumentos remuneratórios de atos praticados pelos serviços notariais e de registro encontra-se pacificada, por força de uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal, o qual definiu, indene de dúvidas, que os emolumentos têm natureza tributária, qualificando-se como "taxas remuneratórias de serviços públicos".
2. Os notários e os oficiais registradores são órgão da fé pública instituídos pelo Estado e desempenham, nesse contexto, função eminentemente pública, qualificando-se, em conseqüência, como agentes públicos delegados. Também, é certo afirmar que tais atividades são diretamente ligadas à Administração Pública e reconhecidas como o poder certificante dos órgãos da fé pública, por envolver o exercício de parcela de autoridade do Estado (poder certificante). Portanto, entende-se que o notário e o registrador sujeitam-se a um estrito regime de direito público, em decorrência da própria natureza de suas atividades e da permanente fiscalização do Poder Judiciário.
3. O serviço notarial e registral é prestado para a satisfação de interesses coletivos, de interesse geral 'uti universi'.
4. Dessa forma, visto que os emolumentos são 'taxas' e que o serviço prestado é típico serviço público, conclui-se que a relação jurídica existente entre o titular da serventia notarial e de registro e os usuários de tais serviços é de Direito Público, de natureza tributária.
5. Afora isso, cumpre salientar que não é de clientela a relação entre o titular da serventia notarial ou de registro e o usuário do serviço, conforme já decidiu o Superior Tribunal Federal (RE n.º 178.236). Na verdade, a relação entre ambos é formada pelo caráter de autoridade, revestida pelo Estado, reconhecida como o poder certificante dos órgãos da fé pública.
6. Conclui-se que a relação jurídica existente entre os cartórios extrajudiciais e os usuários-contribuintes do serviço é de ordem pública, de Direito Público e de interesse coletivo 'uti universi', não havendo qualquer possibilidade de aplicação das normas gerais contidas no Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Além disso, corroborando com tal entendimento, verifica-se que o serviço prestado pelo titular da serventia notarial e registral não gera nenhum vínculo contratual entre ele e o usuário.
7. Com efeito, entende-se não estar incluso no parágrafo único, do art. 22 do CDC, o serviço público delegado pelo Estado à pessoa física do notário ou registrador. Ocorre que o dito dispositivo legal abrange, exclusivamente, as empresas públicas, dotadas de personalidade jurídica própria, tais como as concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
8. Por fim, verifica-se que a responsabilidade do titular do serviço notarial e de registro é regulada por legislação especial, dotada de normas 'específicas', nos termos das Leis 8.935/94, 6.015/73 e 9.492/97.
NOTAS
1. STF - ADC 5 MC/DF - Rel. Min. Nelson Jobim " Tribunal Pleno - DJ 19.09.2003.
2. STF - ADIN 1.378-5 - Espírito Santo - Rel. Min. Celso de Mello - DJ 30.05.1997.
3. Sacha Calmon Navarro Coelho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 4ª edição, Ed. Forense, RJ, 1999, pág. 424 e 425.
4. Ada Pellegrini Grinover e outros - Código Brasileiro de Defesa do Consumidor - Comentado pelos Autores do Anteprojeto - 8ª edição, Ed. Forense Universitária, Rio de Janeiro, 2004, Pág. 49 e 153.
5. Sonia Marilda Péres Alves - "Responsabilidade Civil de Notário e Registradores: a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em suas atividades e a sucessão trabalhista na delegação", Revista de Direito Imobiliário, IRIB, n.º 53, ano 25, julho-dezembro de 2002, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 99.
6. Walter Ceneviva - Lei dos Registros Públicos Comentada - Ed. Saraiva, 2003, 15 edição, pág. 57.
7. STJ - RESP n.º 478958/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, 24/06/2003.
8. STJ - RESP n.º 463331/RO - 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, 06/05/2004.
9. STF - ADC 5 MC/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nelson Jobim, 17/11/1999.
10. TJ/SP - Agravo de Instrumento n.º 236.218.4/6, Comarca de Osasco, 5ª Câmara de Dir. Privado,Rel. Desembargador Silveira Neto, 23.05.2002.
11. Cláudia Lima Marques - Comentários ao Código de Defesa do Consumidor - 2ª edição - RT - pág. 381 e 391.
12. Regnoberto Marques de Melo Jr . Da natureza jurídica dos emolumentos notariais e registrais . Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 591,19 fev. 2005. Disponível em
13. Zelmo Denari - Cód. Brasileiro de Defesa do Consumidor - Comentado pelos autores do anteprojeto, 8ª edição, Ed. Forense Universitária, 2004, pág. 214.
BIBLIOGRAFIA
ALVES, Sonia Marilda Peres. Responsabilidade Civil de Notário e Registradores: a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em suas atividades e a sucessão trabalhista na delegação. Revista de Direito Imobiliário. IRIB. nº 53. ano 25. Ed. RT, julho"dezembro de 2002.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Notários e dos Registradores comentada (Lei nº 8.935/94). 4ª edição, rev., ampli. e atual. até 10 de julho de 2002. São Paulo. Saraiva, 2002.
________. Lei dos Registros Públicos Comentada. 15ª edição. atual. até 1º de outubro de 2002. São Paulo. Saraiva, 2003.
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 4ª edição. Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1999.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 8ª edição. Rio de Janeiro. Ed. Forense Universitária, 2004.
MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª edição. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais, 2006.
MELO JÚNIOR, Regnoberto Marques de. Da Natureza Jurídica dos Emolumentos Notariais e Registrais. us Navigandi. Teresina. a. 9. nº 591. 19 fev. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6313>.
Guilherme Fanti é o autor é assessor jurídico dos Serviços de Registros Públicos e Tabelionato de Protesto de Títulos de Cachoeirinha/RS. Pós-graduado em Direito Imobiliário, Direito Tributário e Pós-graduando em Direito Registral Imobiliário.
NOTA DO REDATOR DO BOLETIM CARTORÁRIO
Pela extensão do trabalho vou ser parcimonioso em sua apreciação. Seu autor não é cartorário, particularidade que muito o valoriza. É um erudito advogado gaúcho, residente em Cachoeirinha, Rio Grande do Sul. Veio ele, acompanhado de carta a mim dirigida, contendo esta particularidade: 'pretendo submeter o artigo à análise do Dr. Antonio Albergaria Pereira', pedido que o tenho como justificativa válida para que seja ele, NA SUA ÍNTEGRA, divulgado no BOLETIM CARTORÁRIO, pois o assunto é de real e efetivo interesse de todos os cartorários 'extrajudiciais'. A sua publicação integral no BOLETIM CARTORÁRIO, só me alegra e me envaidece o que faço com real satisfação, pois o assunto é de real interesse de todos os cartorários.
Fonte:Serjus
O art. 22 do Código de Defesa do Consumidor trata da responsabilidade do poder público, tendo em vista que as pessoas jurídicas de direito público podem figurar no pólo ativo da relação de consumo, como fornecedoras de serviços.
Ocorre que o mencionado art. 22 do CDC faz remissão expressa às 'empresas públicas' concessionárias ou permissionárias de serviços públicos, entes administrativos com personalidade jurídica própria, senão vejamos:
-Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer outra forma de empreendimento,são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.- (grifo nosso)
No que pertine ao serviço notarial e de registro, o entendimento predominante de nossa doutrina e jurisprudência é de que os cartórios extrajudiciais, entes despersonalizados, desprovidos de patrimônio próprio, não possuem personalidade jurídica e não se caracterizam como empresa ou entidade.
Cumpre frisar que, hodiernamente, os serviços notariais e de registro passaram a ser delegados pelo Poder Público, por meio de concurso público, e exercidos, em caráter privado, consoante o disposto no art. 236 da Constituição Federal/88. Assim sendo, os cartórios extrajudiciais constituem, em decorrência de sua própria natureza, função revestida de estatalidade e sujeita, por isso mesmo, a um regime de direito público. Todavia, é preciso frisar que os notários e registradores não exercem cargo público, são classificados como agentes públicos delegados, os quais agem como se fossem o próprio Estado, dotados de autoridade (poder certificante da fé pública). O notário e o registrador exercem uma função pública delegada 'sui generis', exercida no interesse da sociedade e que têm o escopo de garantir a segurança jurídica, a paz social, o bem comum e o desenvolvimento econômico do País.
É certo afirmar que as serventias notariais e de registro não são pessoa jurídica " não são empresa. A afirmação torna-se inequívoca pela análise da relação jurídica existente entre o titular da Serventia e o Estado ou mesmo porque a organização é regulada por lei e os serviços prestados ficam sujeitos ao controle e fiscalização permanente do Poder Judiciário. Ainda, como já mencionado, o cartório não possui personalidade jurídica, a qual só se adquire com o registro dos atos constitutivos na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas.
Nesse sentido, REGNOBERTO MARQUES DE MELO JR., em obra intitulada - "Da Natureza Jurídica dos Emolumentos Notariais e Registrais" - pondera que:
"Vale ponderar de logo que os serviços notariais e registrais (cartórios) não possuem personalidade jurídica. São meras divisões administrativas nas quais os notários e registradores exercem o seu mister, através de delegação estatal. (..) É manifesto que não há atos praticados pelos serviços notariais e de registro.' Os serviços notariais e de registro não praticam atos. Quem os pratica, prescinde referir, são os notários e registradores e seus prepostos, contratados pelo regime celetista."12
Ainda, quanto à interpretação do art. 22 do CDC, pondera Zelmo Denari, in verbis:
-O art. 22 faz remissão às empresas ' rectius empresas públicas ' concessionárias de serviços públicos, entes administrativos com personalidade de Direito Privado."13
Com efeito, por todas as razões apresentadas, entende-se não estar incluso no parágrafo único, do art. 22 do CDC, o serviço público delegado pelo Estado à pessoa física do notário ou registrador. Ocorre que tal dispositivo legal abrange, exclusivamente, as empresas públicas, dotadas de personalidade jurídica própria, tais
como as concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
Por fim, ante a inaplicabilidade das regras gerais do Código de Defesa do Consumidor às atividades atípicas prestadas pelos cartórios, verifica-se que a responsabilidade do titular do serviço notarial e de registro é dotada de regulamentação 'específica', tendo em vista a previsão especial contida na Lei 8.935, de 18.11.1994, que regulamenta o art.236 da Constituição Federal. A Lei nº 8.935/94, disciplina a responsabilidade civil e criminal dos Notários, Oficiais de Registro, Tabeliães e de seus prepostos (Lei 8.935/94 - art. 22 e, 24). Por sua vez, cumpre frisar que, anteriormente, o art. 28 da Lei nº 6.015/73 já havia fixado a responsabilidade subjetiva dos Oficiais de Registro. Posteriormente, a Lei 9.492/97 consagrou, mediante o art. 38, a responsabilidade subjetiva dos tabeliães de protesto de títulos, os quais são pessoalmente responsáveis por todos os prejuízos causados, por dolo ou culpa, pelos substitutos designados ou escreventes autorizados, assegurado o direito de regresso. Portanto, conclui-se que a atividade notarial e de registro subordina-se à legislação especial, algumas promulgadas após o Código de Defesa do Consumidor.
CONCLUSÃO
O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor é um importante microssistema jurídico que visa harmonizar as relações de consumo, além de oferecer segurança e proteção aos consumidores hipossuficientes. Todavia, tais normas não podem ser aplicadas indistintamente, conforme verificou-se no desenvolvimento deste trabalho. Assim sendo, passamos a arrolar as principais conclusões:
1. A natureza jurídica dos emolumentos remuneratórios de atos praticados pelos serviços notariais e de registro encontra-se pacificada, por força de uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal, o qual definiu, indene de dúvidas, que os emolumentos têm natureza tributária, qualificando-se como "taxas remuneratórias de serviços públicos".
2. Os notários e os oficiais registradores são órgão da fé pública instituídos pelo Estado e desempenham, nesse contexto, função eminentemente pública, qualificando-se, em conseqüência, como agentes públicos delegados. Também, é certo afirmar que tais atividades são diretamente ligadas à Administração Pública e reconhecidas como o poder certificante dos órgãos da fé pública, por envolver o exercício de parcela de autoridade do Estado (poder certificante). Portanto, entende-se que o notário e o registrador sujeitam-se a um estrito regime de direito público, em decorrência da própria natureza de suas atividades e da permanente fiscalização do Poder Judiciário.
3. O serviço notarial e registral é prestado para a satisfação de interesses coletivos, de interesse geral 'uti universi'.
4. Dessa forma, visto que os emolumentos são 'taxas' e que o serviço prestado é típico serviço público, conclui-se que a relação jurídica existente entre o titular da serventia notarial e de registro e os usuários de tais serviços é de Direito Público, de natureza tributária.
5. Afora isso, cumpre salientar que não é de clientela a relação entre o titular da serventia notarial ou de registro e o usuário do serviço, conforme já decidiu o Superior Tribunal Federal (RE n.º 178.236). Na verdade, a relação entre ambos é formada pelo caráter de autoridade, revestida pelo Estado, reconhecida como o poder certificante dos órgãos da fé pública.
6. Conclui-se que a relação jurídica existente entre os cartórios extrajudiciais e os usuários-contribuintes do serviço é de ordem pública, de Direito Público e de interesse coletivo 'uti universi', não havendo qualquer possibilidade de aplicação das normas gerais contidas no Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Além disso, corroborando com tal entendimento, verifica-se que o serviço prestado pelo titular da serventia notarial e registral não gera nenhum vínculo contratual entre ele e o usuário.
7. Com efeito, entende-se não estar incluso no parágrafo único, do art. 22 do CDC, o serviço público delegado pelo Estado à pessoa física do notário ou registrador. Ocorre que o dito dispositivo legal abrange, exclusivamente, as empresas públicas, dotadas de personalidade jurídica própria, tais como as concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
8. Por fim, verifica-se que a responsabilidade do titular do serviço notarial e de registro é regulada por legislação especial, dotada de normas 'específicas', nos termos das Leis 8.935/94, 6.015/73 e 9.492/97.
NOTAS
1. STF - ADC 5 MC/DF - Rel. Min. Nelson Jobim " Tribunal Pleno - DJ 19.09.2003.
2. STF - ADIN 1.378-5 - Espírito Santo - Rel. Min. Celso de Mello - DJ 30.05.1997.
3. Sacha Calmon Navarro Coelho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 4ª edição, Ed. Forense, RJ, 1999, pág. 424 e 425.
4. Ada Pellegrini Grinover e outros - Código Brasileiro de Defesa do Consumidor - Comentado pelos Autores do Anteprojeto - 8ª edição, Ed. Forense Universitária, Rio de Janeiro, 2004, Pág. 49 e 153.
5. Sonia Marilda Péres Alves - "Responsabilidade Civil de Notário e Registradores: a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em suas atividades e a sucessão trabalhista na delegação", Revista de Direito Imobiliário, IRIB, n.º 53, ano 25, julho-dezembro de 2002, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 99.
6. Walter Ceneviva - Lei dos Registros Públicos Comentada - Ed. Saraiva, 2003, 15 edição, pág. 57.
7. STJ - RESP n.º 478958/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, 24/06/2003.
8. STJ - RESP n.º 463331/RO - 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, 06/05/2004.
9. STF - ADC 5 MC/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nelson Jobim, 17/11/1999.
10. TJ/SP - Agravo de Instrumento n.º 236.218.4/6, Comarca de Osasco, 5ª Câmara de Dir. Privado,Rel. Desembargador Silveira Neto, 23.05.2002.
11. Cláudia Lima Marques - Comentários ao Código de Defesa do Consumidor - 2ª edição - RT - pág. 381 e 391.
12. Regnoberto Marques de Melo Jr . Da natureza jurídica dos emolumentos notariais e registrais . Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 591,19 fev. 2005. Disponível em
13. Zelmo Denari - Cód. Brasileiro de Defesa do Consumidor - Comentado pelos autores do anteprojeto, 8ª edição, Ed. Forense Universitária, 2004, pág. 214.
BIBLIOGRAFIA
ALVES, Sonia Marilda Peres. Responsabilidade Civil de Notário e Registradores: a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em suas atividades e a sucessão trabalhista na delegação. Revista de Direito Imobiliário. IRIB. nº 53. ano 25. Ed. RT, julho"dezembro de 2002.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Notários e dos Registradores comentada (Lei nº 8.935/94). 4ª edição, rev., ampli. e atual. até 10 de julho de 2002. São Paulo. Saraiva, 2002.
________. Lei dos Registros Públicos Comentada. 15ª edição. atual. até 1º de outubro de 2002. São Paulo. Saraiva, 2003.
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 4ª edição. Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1999.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 8ª edição. Rio de Janeiro. Ed. Forense Universitária, 2004.
MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª edição. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais, 2006.
MELO JÚNIOR, Regnoberto Marques de. Da Natureza Jurídica dos Emolumentos Notariais e Registrais. us Navigandi. Teresina. a. 9. nº 591. 19 fev. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6313>.
Guilherme Fanti é o autor é assessor jurídico dos Serviços de Registros Públicos e Tabelionato de Protesto de Títulos de Cachoeirinha/RS. Pós-graduado em Direito Imobiliário, Direito Tributário e Pós-graduando em Direito Registral Imobiliário.
NOTA DO REDATOR DO BOLETIM CARTORÁRIO
Pela extensão do trabalho vou ser parcimonioso em sua apreciação. Seu autor não é cartorário, particularidade que muito o valoriza. É um erudito advogado gaúcho, residente em Cachoeirinha, Rio Grande do Sul. Veio ele, acompanhado de carta a mim dirigida, contendo esta particularidade: 'pretendo submeter o artigo à análise do Dr. Antonio Albergaria Pereira', pedido que o tenho como justificativa válida para que seja ele, NA SUA ÍNTEGRA, divulgado no BOLETIM CARTORÁRIO, pois o assunto é de real e efetivo interesse de todos os cartorários 'extrajudiciais'. A sua publicação integral no BOLETIM CARTORÁRIO, só me alegra e me envaidece o que faço com real satisfação, pois o assunto é de real interesse de todos os cartorários.
Fonte:Serjus