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30 de Junho de 2006
Prova eletrônica- Dados do computador equivalem a documentos do escritório
Dados armazenados no disco rígido do computador estão protegidos pela prerrogativa constitucional que protege o siglo da correspondência? Esta pergunta começou a ser respondida pelo Supremo Tribunal Federal e a resposta é não. Para os ministros do Supremo, que acompanharam o voto do relator Sepúlveda Pertence, os dados guardados no computador são documentos da mesma natureza dos documentos de papel guardados nos arquivos de aço do escritório.
O Supremo não decidiu a questão relativa ao sigilo do e-mail. O entendimento prevalente foi emanado do Superior Tribunal de Justiça que entendeu que a correspondência de papel depois de aberta é um documento comum e não é mais inviolável. Por analogia o e-mail também deixa de ser inviolável depois que é aberto e passa a ser um documento comum.
Ao se debruçar sobre a questão da inviolabilidade dos dados dados armazenados no computador, em maio, os ministros do Supremo entenderam que não - dados armazenados na memória do computador não têm direito ao sigilo que a Constituição reserva à correspondência. O voto vencedor foi o do relator, ministro Sepúlveda Pertence, que sustentou que a Constituição protege a troca de dados, e não os dados em si. Para Pertence, os dados contidos no computador não estão protegidos pela lei. A inviolabilidade refere-se à interferência de um terceiro na troca destas informações. Se os dados fossem invioláveis também, o ministro acredita que qualquer investigação administrativa seria impossível.
Em seu voto, Sepúlveda Pertence citou entendimento de Tércio Ferraz, publicado em seu livro Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado. "A troca de informações privativas é que não pode ser violada por sujeito estranho à comunicação. De outro modo, se alguém, por razões não profissionais, legitimamente tomasse conhecimento de dados incriminadores relativos a uma pessoa, ficaria impedido de cumprir o seu dever de denunciá-lo", comparara Tércio Ferraz.
A citação também foi usada no voto de Pertence para embasar caso semelhante discutido em 1995. Na ocasião, o ministro saiu vencido, mas ele explica que estava em jogo outra questão: se dados de um computador podem ser usados como prova no caso em que a máquina foi apreendida sem a devida autorização judicial.
Dessa vez, o que estava em discussão era a apreensão do computador de um empresário acusado de crime tributário. Os ministros concluíram que o Mandado de Busca e Apreensão autorizava que o computador fosse recolhido e entenderam que os dados contidos deles não estão sob a proteção constitucional. Portando, podem ser usados como provas.
Leia a íntegra do voto
04/04/2006 PRIMEIRA TURMA
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 418.416-8 SANTA CATARINA
RELATOR : MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
RECORRENTE(S) : XXX
ADVOGADO(A/S) : XXX
RECORRIDO(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
R E L A T Ó R I O
O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE - O Juiz Federal de Santa Catarina deferiu pedido de busca e apreensão na sede de duas empresas, das quais o recorrente é sócio-gerente, sob o fundamento de que os documentos que instruíram o requerimento do Ministério Público - autos de reclamação trabalhista e declaração de importação e fatura - indiciavam a existência de "caixa 2", "falta de registro de empregados" e "sonegação de tributos".
02. A decisão judicial - após enfatizar que a justificativa do requerimento era especialmente relacionada com a apuração de eventuais crimes tributários -, assim se fundamentou (f. 868/871):
"A diligência pretendida é extremamente séria, eis que tem por escopo verificar como ocorreu que a Declaração de Importação n. 97/0675494-6 registra quantidade em dúzias (fl. 47) e a fatura (fl. 66) em unidades do mesmo produto, a exemplo: estatuetas de porcelana (...), 60 dúzias, ao preço unitário de U$ 1,20 (fl. 49), constando da fatura (fl. 66) o valor simbólico de U$ 72,00 (60 x 1.20), quando o correto seria calcular 60 x 12 x 1.20, total: U$ 864,00.
Assim, o imposto recolhido incidiu sobre minguados U$ 72,00, escapando os restantes U$ 792,00 ilesos.
Este é apenas um caso, ou melhor, somente uma operação de importação das tantas já realizadas, merecendo total esclarecimento em vista do interesse público que envolve a matéria de natureza tributária.
Assim, a disposição prevista na Lei 9.034/95 é aplicável, eis que pressuposta a atuação de organizações criminosas estruturadas em quadrilha ou bando, o que, ao que o feito está a indicar até o momento, encontra-se presente, na medida em que tamanha discrepância de valores passou despercebida pela fiscalização da Receita Federal.
Ao apreciar o aparente conflito existente entre, de um lado, o interesse individual na persecução do sigilo e, de outro, o interesse público, traduzido pela investigação criminal, concluiu o Ministro da Corte Suprema:
`Ainda que sem conotação da regra absoluta, e especialmente à vista da situação registrada na espécie destes autos - em que o direito individual à preservação do sigilo opõe-se a um bem jurídico de valor coletivo (a primazia do interesse público subjacente à investigação penal, à persecução criminal e à repressão dos delitos em geral) - torna-se relevante admitir, no que concerne à superação do conflito entre direitos fundamentais, a adoção de critério que, fundado em juízo de ponderação, faça prevalecer, em face das circunstâncias concretas, o direito vocacionado à plena elucidação da verdade real e da pesquisa referente aos fatos qualificados pela nota da ilicitude penal´ (STF, Inq nº 830-3, rel Min. Celso de Mello, data da decisão: 19.12.94, p. 57.492).
Por outro lado, é sabido que hoje em dia todos, ou praticamente todos os registros encontram-se armazenados em computador, bastando um simples `delete´ para apagar milhões de arquivos ao menor sinal de perigo, mostrando-se totalmente inócuo qualquer provimento que almejasse substituir a busca e apreensão, até porque dotado do elemento surpresa.
(...)
Por isso, a diligência merece ser agraciada com o maior sigilo possível, a começar pelo Segredo de Justiça.
III - Dispositivo.
Em face do exposto, decreto SEGREDO DE JUSTIÇA nos presentes autos, visando resguardar as pessoas investigadas, bem como o interesse público na apuração dos fatos, com arrimo no art. 20 do CPP c/c o art. 3º da Lei 9.034/95.
Ordeno que a Polícia Federal, com base nos arts. 240 e seguintes do CPP e art. 2º, III, da Lei 9.034/95, efetue a busca e apreensão de documentos (livros, registros e papéis contábeis) e equipamentos de informática (computadores e disquetes) interessantes à investigação, a serem selecionados pelas autoridades encarregadas da diligência nas empresas Havan Tecidos da Moda Ltda. e Havan Importadora Ltda., não olvidando a autoridade policial das garantias insculpidas na Carta Magna e na lei processual penal.
(...)
Expeçam o competente mandado, com os requisitos do art. 243 do CPP (...)".
03. O mandado expedido autorizou a busca e apreensão nas empresas de "documentos (livros, registros e papéis contábeis) e equipamentos de informática (computadores e disquetes) interessantes à investigação, a serem selecionados pelas autoridades encarregadas da diligência, bem como quaisquer outros elementos indicadores de ilícito" (f. 873).
04. Cumprido, foram apreendidos documentos (notas fiscais, livros contábeis, duplicatas etc.) e equipamentos de informática (discos rígidos e cópia do conteúdo de alguns deles) - f. 873-4; 875-6.
05. Requereu então o Ministério Público Federal prazo adicional para, com o apoio da Polícia Federal, finalizar a análise dos documentos recolhidos, o que foi deferido (f. 878/879).
06. Conforme noticia o recorrente, antes de concluído esse trabalho, o MPF comunicou ao Juízo Federal que requisitara à Polícia Federal em Itajaí-SC a "abertura de Inquérito Policial relativo a parte dos fatos objeto" da busca e apreensão.
07. À instauração do inquérito sobreveio ação penal por crime de descaminho.
08. O TRF/4ª, contudo, determinou o trancamento do referido processo (f. 708).
09. Depois de devolvido parte do material apreendido (f. 883), foi determinada a extensão dos efeitos do decreto de busca e apreensão para que a Receita Federal e a "Fiscalização do INSS" tivessem acesso aos "dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais" das empresas, para fins de investigação e cooperação na persecução criminal, "observado o sigilo imposto ao feito" (f. 910).
10. A Receita Federal - que instaurou procedimento fiscal também amparado no produto da busca e apreensão - requereu então a quebra do sigilo bancário das empresas e das pessoas constantes do quadro, medida deferida e, em parte, efetivada (f. 950/954; 986 e seg.).
11. Contra essa decisão e o decreto de busca e apreensão foi impetrado mandado de segurança ao TRF/4ª Região, que o deferiu em parte, para desobrigar as instituições financeiras de prestarem quaisquer informações bancárias (1.079/1.081 e 1.117/1.148).
12. Em conseqüência, procedeu-se ao desentranhamento das informações bancárias até então prestadas e à devolução às empresas da documentação respectiva (1.117/1.119; 1.127/1.129; e 1.172).
O Supremo não decidiu a questão relativa ao sigilo do e-mail. O entendimento prevalente foi emanado do Superior Tribunal de Justiça que entendeu que a correspondência de papel depois de aberta é um documento comum e não é mais inviolável. Por analogia o e-mail também deixa de ser inviolável depois que é aberto e passa a ser um documento comum.
Ao se debruçar sobre a questão da inviolabilidade dos dados dados armazenados no computador, em maio, os ministros do Supremo entenderam que não - dados armazenados na memória do computador não têm direito ao sigilo que a Constituição reserva à correspondência. O voto vencedor foi o do relator, ministro Sepúlveda Pertence, que sustentou que a Constituição protege a troca de dados, e não os dados em si. Para Pertence, os dados contidos no computador não estão protegidos pela lei. A inviolabilidade refere-se à interferência de um terceiro na troca destas informações. Se os dados fossem invioláveis também, o ministro acredita que qualquer investigação administrativa seria impossível.
Em seu voto, Sepúlveda Pertence citou entendimento de Tércio Ferraz, publicado em seu livro Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado. "A troca de informações privativas é que não pode ser violada por sujeito estranho à comunicação. De outro modo, se alguém, por razões não profissionais, legitimamente tomasse conhecimento de dados incriminadores relativos a uma pessoa, ficaria impedido de cumprir o seu dever de denunciá-lo", comparara Tércio Ferraz.
A citação também foi usada no voto de Pertence para embasar caso semelhante discutido em 1995. Na ocasião, o ministro saiu vencido, mas ele explica que estava em jogo outra questão: se dados de um computador podem ser usados como prova no caso em que a máquina foi apreendida sem a devida autorização judicial.
Dessa vez, o que estava em discussão era a apreensão do computador de um empresário acusado de crime tributário. Os ministros concluíram que o Mandado de Busca e Apreensão autorizava que o computador fosse recolhido e entenderam que os dados contidos deles não estão sob a proteção constitucional. Portando, podem ser usados como provas.
Leia a íntegra do voto
04/04/2006 PRIMEIRA TURMA
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 418.416-8 SANTA CATARINA
RELATOR : MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
RECORRENTE(S) : XXX
ADVOGADO(A/S) : XXX
RECORRIDO(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
R E L A T Ó R I O
O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE - O Juiz Federal de Santa Catarina deferiu pedido de busca e apreensão na sede de duas empresas, das quais o recorrente é sócio-gerente, sob o fundamento de que os documentos que instruíram o requerimento do Ministério Público - autos de reclamação trabalhista e declaração de importação e fatura - indiciavam a existência de "caixa 2", "falta de registro de empregados" e "sonegação de tributos".
02. A decisão judicial - após enfatizar que a justificativa do requerimento era especialmente relacionada com a apuração de eventuais crimes tributários -, assim se fundamentou (f. 868/871):
"A diligência pretendida é extremamente séria, eis que tem por escopo verificar como ocorreu que a Declaração de Importação n. 97/0675494-6 registra quantidade em dúzias (fl. 47) e a fatura (fl. 66) em unidades do mesmo produto, a exemplo: estatuetas de porcelana (...), 60 dúzias, ao preço unitário de U$ 1,20 (fl. 49), constando da fatura (fl. 66) o valor simbólico de U$ 72,00 (60 x 1.20), quando o correto seria calcular 60 x 12 x 1.20, total: U$ 864,00.
Assim, o imposto recolhido incidiu sobre minguados U$ 72,00, escapando os restantes U$ 792,00 ilesos.
Este é apenas um caso, ou melhor, somente uma operação de importação das tantas já realizadas, merecendo total esclarecimento em vista do interesse público que envolve a matéria de natureza tributária.
Assim, a disposição prevista na Lei 9.034/95 é aplicável, eis que pressuposta a atuação de organizações criminosas estruturadas em quadrilha ou bando, o que, ao que o feito está a indicar até o momento, encontra-se presente, na medida em que tamanha discrepância de valores passou despercebida pela fiscalização da Receita Federal.
Ao apreciar o aparente conflito existente entre, de um lado, o interesse individual na persecução do sigilo e, de outro, o interesse público, traduzido pela investigação criminal, concluiu o Ministro da Corte Suprema:
`Ainda que sem conotação da regra absoluta, e especialmente à vista da situação registrada na espécie destes autos - em que o direito individual à preservação do sigilo opõe-se a um bem jurídico de valor coletivo (a primazia do interesse público subjacente à investigação penal, à persecução criminal e à repressão dos delitos em geral) - torna-se relevante admitir, no que concerne à superação do conflito entre direitos fundamentais, a adoção de critério que, fundado em juízo de ponderação, faça prevalecer, em face das circunstâncias concretas, o direito vocacionado à plena elucidação da verdade real e da pesquisa referente aos fatos qualificados pela nota da ilicitude penal´ (STF, Inq nº 830-3, rel Min. Celso de Mello, data da decisão: 19.12.94, p. 57.492).
Por outro lado, é sabido que hoje em dia todos, ou praticamente todos os registros encontram-se armazenados em computador, bastando um simples `delete´ para apagar milhões de arquivos ao menor sinal de perigo, mostrando-se totalmente inócuo qualquer provimento que almejasse substituir a busca e apreensão, até porque dotado do elemento surpresa.
(...)
Por isso, a diligência merece ser agraciada com o maior sigilo possível, a começar pelo Segredo de Justiça.
III - Dispositivo.
Em face do exposto, decreto SEGREDO DE JUSTIÇA nos presentes autos, visando resguardar as pessoas investigadas, bem como o interesse público na apuração dos fatos, com arrimo no art. 20 do CPP c/c o art. 3º da Lei 9.034/95.
Ordeno que a Polícia Federal, com base nos arts. 240 e seguintes do CPP e art. 2º, III, da Lei 9.034/95, efetue a busca e apreensão de documentos (livros, registros e papéis contábeis) e equipamentos de informática (computadores e disquetes) interessantes à investigação, a serem selecionados pelas autoridades encarregadas da diligência nas empresas Havan Tecidos da Moda Ltda. e Havan Importadora Ltda., não olvidando a autoridade policial das garantias insculpidas na Carta Magna e na lei processual penal.
(...)
Expeçam o competente mandado, com os requisitos do art. 243 do CPP (...)".
03. O mandado expedido autorizou a busca e apreensão nas empresas de "documentos (livros, registros e papéis contábeis) e equipamentos de informática (computadores e disquetes) interessantes à investigação, a serem selecionados pelas autoridades encarregadas da diligência, bem como quaisquer outros elementos indicadores de ilícito" (f. 873).
04. Cumprido, foram apreendidos documentos (notas fiscais, livros contábeis, duplicatas etc.) e equipamentos de informática (discos rígidos e cópia do conteúdo de alguns deles) - f. 873-4; 875-6.
05. Requereu então o Ministério Público Federal prazo adicional para, com o apoio da Polícia Federal, finalizar a análise dos documentos recolhidos, o que foi deferido (f. 878/879).
06. Conforme noticia o recorrente, antes de concluído esse trabalho, o MPF comunicou ao Juízo Federal que requisitara à Polícia Federal em Itajaí-SC a "abertura de Inquérito Policial relativo a parte dos fatos objeto" da busca e apreensão.
07. À instauração do inquérito sobreveio ação penal por crime de descaminho.
08. O TRF/4ª, contudo, determinou o trancamento do referido processo (f. 708).
09. Depois de devolvido parte do material apreendido (f. 883), foi determinada a extensão dos efeitos do decreto de busca e apreensão para que a Receita Federal e a "Fiscalização do INSS" tivessem acesso aos "dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais" das empresas, para fins de investigação e cooperação na persecução criminal, "observado o sigilo imposto ao feito" (f. 910).
10. A Receita Federal - que instaurou procedimento fiscal também amparado no produto da busca e apreensão - requereu então a quebra do sigilo bancário das empresas e das pessoas constantes do quadro, medida deferida e, em parte, efetivada (f. 950/954; 986 e seg.).
11. Contra essa decisão e o decreto de busca e apreensão foi impetrado mandado de segurança ao TRF/4ª Região, que o deferiu em parte, para desobrigar as instituições financeiras de prestarem quaisquer informações bancárias (1.079/1.081 e 1.117/1.148).
12. Em conseqüência, procedeu-se ao desentranhamento das informações bancárias até então prestadas e à devolução às empresas da documentação respectiva (1.117/1.119; 1.127/1.129; e 1.172).