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07 de Novembro de 2006

Clipping - Folha de São Paulo - Certidão de nascimento denuncia novo caso de "gato" no futebol brasileiro

Brasil usou "gato" que agora está na mira do São Paulo

Carlos Alberto, do Figueirense, tem 5 anos a mais do que diz, mostra certidão obtida na sua cidade de nascimento

Caso é mais um na longa lista de fraudes de jogadores nacionais, em prática que a Fifa já puniu o México, mas nunca o Brasil

O volante Carlos Alberto, do Figueirense, é ""gato", gíria para identificar um jogador com idade adulterada. Campeão Mundial sub-20 pela seleção brasileira em 2003, nos Emirados Árabes (quando tinha 25 anos), o jogador nascido no Rio adulterou a sua idade em cinco anos, um recorde nas fraudes de atletas que disputaram competições oficiais por seleções brasileiras -o recorde anterior pertencia a Bell, que "rejuvenesceu" três anos.

Uma segunda via da certidão de nascimento do atleta obtida pela Folha revela que Carlos Alberto de Oliveira nasceu em 24 de janeiro de 1978. Pela documentação do jogador no clube catarinense, ele se declara como tendo nascido em 24 de janeiro de 1983. O atleta tem 28 anos e não 23 como afirma.

A fraude na idade de jogadores já tirou o México de competições mundiais por dois anos, mas a Fifa não puniu o Brasil em 1999, quando a Folha revelou que quatro jogadores (Sandro Hiroshi, Bell, Anaílson e Henrique) jogaram sul-americanos ou Mundiais da entidade com documentos falsos.

O Brasil ainda exportou "gatos" para a Copa do Mundo de 1998 -o atacante Oliveira, que defendeu a Bélgica, e o lateral Clayton, pela Tunísia.

A Fifa alegou na ocasião que a CBF não havia participado das fraudes.
Além de alterar a idade, o volante adulterou o seu nome e a cidade em que nasceu. De acordo com a assessoria de imprensa do Figueirense, consta na carteira de identidade do atleta que ele nasceu em "São Matheus (RJ)". Não existe município com esse nome no Estado do Rio. No documento, seu nome aparece como Carlos Alberto de Oliveira Júnior.

A certidão de nascimento verdadeira do jogador está registrada no cartório de Rio Bonito (município a 74 km da capital fluminense), cidade onde nasceu e iniciou a carreira.

Maternidade

No documento oficial, Elza Maria de Oliveira, mãe do atleta da equipe catarinense, declara que o filho nasceu às 23h do dia 24 de janeiro de 1978 no Hospital Regional Darcy Vargas, localizado em Rio Bonito.

O documento mostra que o volante do Figueirense foi registrado pela família quando já tinha quatro anos. A certidão foi expedida no dia 20 de maio de 1981. De acordo com funcionários do cartório, o fato não é incomum.

Antes da alteração da lei que regula os registros de nascimento, não era necessário o ofício da maternidade para obter uma certidão. A criança podia ser registrada na presença de duas testemunhas, o que ocorreu no caso de Carlos Alberto.

Registros obtidos no Hospital Regional Darcy Vargas mostram que a mãe do jogador teve um filho na maternidade 19 dias antes do declarado na certidão de nascimento (24 de janeiro de 1978). Pelo livro do hospital, a mãe do jogador teve uma criança às 23h55 do dia 5 de janeiro de 1978. Na documentação, está escrito que o bebê pesava 3,7 kg e tinha estatura de 50 cm.

Além das sanções esportivas, o volante do Figueirense pode responder na Justiça a acusação de falsidade ideológica ("omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante"). A pena prevista neste caso, se condenado, é de reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público.

Destaque no futebol de Rio Bonito, o volante Carlos Alberto começou no Joinville, no ano 2000. Depois, jogou no Marcílio Dias-SC, no Guarani-MG e no Caxias de Joinville. Em maio de 2003, transferiu-se para o Figueirense, atual nono colocado da Série A do Brasileiro.

Um primo de Carlos Alberto já foi envolvido em outro escândalo internacional sobre ""gatos'" no futebol.

Em 2002, o hoje Eriberto, do Chievo, admitiu que falsificou a identidade. O jogador se chama Luciano Siqueira de Oliveira e é três anos mais velho do que declarava. Em reportagem publicada em um jornal italiano, ele declarou que alterou sua documentação em 1996 para virar profissional e ""sair da pobreza" em que vivia no Brasil.

Carlos Alberto está nos planos do São Paulo para a próxima temporada. A diretoria do clube do Morumbi prefere não comentar sobre a negociação com o jogador. Mesmo assim, o técnico Muricy Ramalho não poupa elogios para o volante.
""Carlos Alberto é muito bom jogador. Marca bem, e o condicionamento físico é invejável. É jovem e tem uma vida útil longa para o São Paulo. Todo o histórico do atleta me agrada", declarou Muricy, na semana passada, aparentemente sem saber da fraude que o envolve.

Autor: Sérgio Rangel

Em 1999, punição foi para atletas

Pelo histórico brasileiro, os jogadores pagam sozinho por adulterações nas suas idades.

Nos quatro casos revelados pela Folha em 1999, nenhum clube foi punido. Sandro Hiroshi provou punição ao São Paulo, em episódio que acabou com mais uma virada de mesa no Campeonato Brasileiro, mas não por adulterar a idade, e sim por problemas em seu contrato.

A CBF suspendeu preventivamente os contratos de Hiroshi, Anaílson, Bell e Henrique e enviou o caso para o tribunal esportivo. Lá, os "gatos" receberam suspensões que variaram entre 120 e 180 dias.

Dentro de campo, a carreira do quarteto teve poucos altos (como no caso de Anaílson no São Caetano no começo desta década) e muitos baixos depois da revelação da fraude há sete anos.

Consultada pela Folha em 2000, a Fifa disse que "não era problema dela se o jogador atuou com idade correta ou não".

Volante nega fraude; time fica surpreso

Carlos Alberto negou ontem que tenha fraudado a data de seu nascimento. Ao ser questionado pela Folha sobre a adulteração, o jogador disse: ""Isto não tem nada a ver".

Na rápida entrevista de um minuto e 23 segundos, por telefone, Carlos Alberto disse que nasceu em 1983 e que tinha 23 anos.

Questionado sobre sobre o nome da cidade em que nasceu no Rio, o jogador não respondeu. ""Não estou escutando...", disse o atleta, que se calou. Em seguida a ligação foi interrompida, com o telefone tendo sido desligado. A Folha ligou mais quatro vezes para seu celular, mas não conseguiu contato.

O empresário do jogador que se identificou apenas como Joacir disse que não tinha nada a declarar na primeira vez que foi entrevistado ontem. Cerca de meia hora depois, ele ligou para a Redação e declarou que estava surpreso. Informou que não era empresário do jogador, mas não manteve sua versão. ""Dou apenas uma ajuda, mas não recebo nada."

A diretoria do Figueirense informou ontem oficialmente que ficou ""surpresa" com o caso. (SR)

Idade do jogador é desconhecida por vizinhos no interior fluminense

A idade de Carlos Alberto é desconhecida por moradores de Boa Esperança, distrito de Rio Bonito, onde o volante do Figueirense nasceu e deu os primeiros chutes.

Todos gostam de falar que conhecem o jogador da agremiação catarinense, mas nenhuma das 16 pessoas ouvidas pela Folha sabia dizer a idade do jogador.
""Conheço [o jogador] desde criança. É um rapaz esforçado, bom de bola. Jogamos junto no Só Preto [time da localidade]", disse José Carlos Monteiro dos Santos, 40, que mora numa casa na mesma rua onde os familiares de Carlos Alberto residem em Rio Bonito.

"Sobre isso, não sei não. Não tenho nem idéia", disse Santos, ao ser questionado a respeito da verdadeira idade do jogador do Figueirense.

"Ele é um bom garoto, mas quem sabe responder é a mãe dele", disse Márcio Abreu, 32, mostrando a localização da casa da família do jogador.
Na casa, ninguém atendeu a reportagem. Embora todos os moradores afirmassem que a mãe do jogador estava em casa, vizinhos diziam que ela tinha ""acabado de viajar".

Poucos antes, um homem que ouvia os moradores sendo entrevistados entrou na casa da mãe do atleta e deixou o local às pressas. Ele não quis falar à Folha.
Primo de Carlos Alberto, Fábio Oliveira fez uma série de elogios ao parente, mas também desconhecia a idade.

"Não sei. Sou muito novo", disse Oliveira, 16. Ele mora na casa ao lado da mãe do atleta.

No bar, que serve de sede informal do Só Preto [time que Carlos Alberto jogava nos finais de semana], as três pessoas ouvidas contaram histórias do jogador, mas todas disseram desconhecer a idade do volante do Figueirense. (SR)

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