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27 de Agosto de 2007
Paternidade Responsável - Em menos de um ano, Projeto Paternidade Responsável de São Paulo recebe mais de 45 mil indicações de supostos pais
"Ao pai, compete criar, educar, manter e representar seus filhos". Essa é a opinião de Durvalino Cristiano Wetterich Domingues, oficial designado do Registro Civil e Tabelião de Notas do Distrito de São Lourenço do Turvo, do município de Matão, localizado no centro norte paulista. Mas como garantir tal direito quando a criança não conhece seu verdadeiro pai? E quantas estão nessa situação no Estado de São Paulo?
Segundo a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen - SP), de 5% a 7% das crianças e jovens em idade escolar tem só o nome da mãe no registro de nascimento. Esse percentual varia entre 10% e 12% em todo o território brasileiro.
O índice do Estado corresponde a aproximadamente 357 mil crianças que não têm paternidade reconhecida em um universo de cinco milhões de registros. Já na Capital, dos 1,3 milhões de estudantes da rede pública, 123 mil não tem o nome do pai na certidão. Durvalino revela que Itaquera foi o primeiro bairro a ter esses números observados e participar do projeto piloto Paternidade Responsável, em setembro do ano passado.
Essa ação foi inspirada no Projeto Pai Legal, idealizado pela Arpen, que, com o apoio do Governo do Estado de São Paulo, pela Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania (SJDC), lançou em agosto de 2004, uma campanha de conscientização para estimular o reconhecimento voluntário da paternidade e a adoção unilateral por parte dos padrastos.
Foram distribuídas 50 mil cartilhas do projeto e material de divulgação pela Secretaria da Justiça e pela Arpen para 645 cidades do Estado. A partir desse movimento, multiplicadores foram criados em parcerias com a Secretaria da Educação, ONGs, associações de bairro e diversas entidades.
Em um ano de projeto, 2.326 crianças passaram a ter o nome do pai em seu registro de nascimento. A parceria entre a Arpen SP e o Governo do Estado de São Paulo estabeleceu ainda que a Secretaria da Educação encaminhe ao cartório mais próximo da residência da mãe casos em que a certidão de nascimento do filho matriculado na instituição pública não tenha o nome do pai. Assim, o oficial pode orientar diretamente os interessados na solução desse problema.
No segundo semestre de 2006, a primeira fase do projeto, ainda piloto, promoveu ações que mobilizaram oficiais de cartório e seus funcionários, diretores dos colégios, juízes, funcionários dos fóruns das cidades, voluntários e colaboradores. Em 2007, o projeto Paternidade Responsável deixou de ser piloto e passou a ser uma mobilização contínua que abrange toda São Paulo. Até o dia 28 de junho desse ano, foram feitas 31.758 solicitações de indicação de suposto pai em 495 cartórios dos municípios do Estado.
Em 05 de agosto, considerado Dia da Paternidade Responsável, foi aberta a segunda etapa desse projeto. Segundo o presidente da Arpen, Dr. Antonio Guedes Netto, os cartórios de mais de 300 cidades do Estado ainda estão enviando as suas estatísticas. "É possível notar o sucesso da ação, que envolveu 1.980 escolas públicas. Dos 36.592 atendimentos, foram contabilizados 16.914 indicações de supostos pais; 8.636 audiências realizadas; 3.646 cartas enviadas para os alegados pais serem ouvidos em outros municípios ou Estados; e 3.118 encaminhamentos à Defensoria Pública/OAB para dar continuidade ao processo - seja para investigação da paternidade ou pedido de DNA. O projeto ainda possibilitou que 775 casos fossem encaminhados à adoção unilateral - quando o homem que mora com a mãe do estudante, mesmo não sendo o pai biológico, deseja registrá-lo como seu filho - e 76 mil mães indicaram o nome do suposto pai, resultando em cerca de seis mil reconhecimentos realizados de forma espontânea".
"Todos trabalharam com afinco nessa mobilização tão especial que contempla um objetivo social. É gratificante ver nos olhos daquelas crianças a esperança do reconhecimento, não só no papel, mas na vida", comemora Durvalino.
Em Sorocaba, o projeto envolveu as 5.192 crianças matriculadas na rede pública sem o nome do pai no registro e 800 dessas tiveram indicação, pelas mães, de seus supostos pais. Santo André notificou 1.005 mães e 40% já apontaram os pais para o reconhecimento. Na região de Matão, mais de 400 mães foram notificadas, sendo que 102 indicaram os supostos pais nas 92 audiências realizadas neste mês.
Todos os supostos pais intimados foram indicados pelas mães, como sendo o pai biológico de seus filhos, esclareceu Durvalino. "Na audiência lhe fora perguntado se o mesmo era ou não o pai da criança. Sendo positiva a resposta, no ato o pai assinou um termo de reconhecimento de paternidade para que, por meio de um Mandado de Averbação o Cartório de Registro Civil em que foi registrada a criança, registre a margem do termo, o nome do pai e dos respectivos avós paternos. Assim será expedido uma nova certidão com a paternidade reconhecida. Sendo negativa a resposta do suposto pai, a mãe foi encaminhada a OAB para a investigação de paternidade".
Claudinei José Pires, oficial de Registro Civil de Capão Redondo, disse que "a iniciativa serviu para abrir os olhos da sociedade para o problema, mostrando que a solução é bem mais simples do que pode parecer". Luiz Fernando Matheus, oficial do 40º Cartório Brasilândia, compartilhou essa opinião: "Sem qualquer dúvida, esse projeto mostra o real interesse do Poder Judiciário em estar cada vez mais envolvido com a sociedade. Ajudamos o 22º subdistrito - Tucuruvi, na primeira fase do projeto, onde a estimativa era de comparecimento de em torno de 300 casos, mas o atendimento ficou perto da metade desse número. Mas, por causa do o ínfimo número de procura, não participamos da segunda fase."
Pai: presença no documento e na vida do filho
Vera Lucia Anselmi Melis, diretora-executiva do Aryran Instituto de Desenvolvimento Humano, Cultura e Meio Ambiente, acredita que ter o nome do pai no documento é apenas um dos direitos que se deve garantir a toda criança. E defende que a paternidade responsável é o reflexo de muitas mulheres abandonadas quando sabem que estão grávidas. "Por isso, o sentimento de paternidade deve ser cultivado desde cedo, com as primeiras orientações sobre sexualidade. Falamos aos jovens como evitar filhos, mas muito pouco sobre o que fazer quando uma criança chega. A responsabilidade de ter um filho, cuidar e educar é de toda uma cidade, mas particularmente dos pais que, se estabelecem os vínculos, fortalecem sua participação no mundo e proporcionam dias felizes".
O projeto Paternidade Responsável é de muita relevância, avalia Dra. Esalba Maria Silveira, doutora em Serviço Social, terapeuta de Casal e Família e coordenadora do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (CEFI). Para ela, o registro civil é a primeira inscrição de cidadania de uma pessoa, porque comprova a existência daquele cidadão para aquele país, e é, ao mesmo tempo, um dever da família e um direito de todos.
Outro aspecto que chama a atenção da terapeuta na ausência do reconhecimento da paternidade são as desigualdades sociais entre o feminino e o masculino na nossa sociedade, e a desigualdade dos papéis sociais dentro da família. Dra. Esalba explicou que uma das repercussões é o número cada vez maior de famílias monoparentais, cuja manutenção dos filhos recai exclusivamente sobre a mulher. "Levanto também os aspectos simbólico-afetivos, que vão se constituindo a partir da ausência, os quais dizem respeito a uma construção social da identidade masculina pautada pela omissão e pela vulnerabilidade. Além dessa ausência, representa também uma perda: os pais perdem muito quando não assumem a paternidade, embora muitos não tenham a consciência disso".
Ela ressalta que a identidade da criança é afetada com todo esse processo de reconhecimento ou não de sua paternidade. E a família brasileira não difere muito da própria realidade brasileira. Para Dra. Esalba, a família está em permanente processo de transformação e crescimento, revisando seus conceitos e papéis. "Há o dilema constante da manutenção de valores éticos. Por outro lado, existe a sedução de encurtar os caminhos para chegar ao seu destino. Tenho muita esperança na família brasileira, que tem se mostrado muito competente e flexível frente aos descaminhos políticos da nossa sociedade", conclui. (Luciene Correia)
Segundo a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen - SP), de 5% a 7% das crianças e jovens em idade escolar tem só o nome da mãe no registro de nascimento. Esse percentual varia entre 10% e 12% em todo o território brasileiro.
O índice do Estado corresponde a aproximadamente 357 mil crianças que não têm paternidade reconhecida em um universo de cinco milhões de registros. Já na Capital, dos 1,3 milhões de estudantes da rede pública, 123 mil não tem o nome do pai na certidão. Durvalino revela que Itaquera foi o primeiro bairro a ter esses números observados e participar do projeto piloto Paternidade Responsável, em setembro do ano passado.
Essa ação foi inspirada no Projeto Pai Legal, idealizado pela Arpen, que, com o apoio do Governo do Estado de São Paulo, pela Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania (SJDC), lançou em agosto de 2004, uma campanha de conscientização para estimular o reconhecimento voluntário da paternidade e a adoção unilateral por parte dos padrastos.
Foram distribuídas 50 mil cartilhas do projeto e material de divulgação pela Secretaria da Justiça e pela Arpen para 645 cidades do Estado. A partir desse movimento, multiplicadores foram criados em parcerias com a Secretaria da Educação, ONGs, associações de bairro e diversas entidades.
Em um ano de projeto, 2.326 crianças passaram a ter o nome do pai em seu registro de nascimento. A parceria entre a Arpen SP e o Governo do Estado de São Paulo estabeleceu ainda que a Secretaria da Educação encaminhe ao cartório mais próximo da residência da mãe casos em que a certidão de nascimento do filho matriculado na instituição pública não tenha o nome do pai. Assim, o oficial pode orientar diretamente os interessados na solução desse problema.
No segundo semestre de 2006, a primeira fase do projeto, ainda piloto, promoveu ações que mobilizaram oficiais de cartório e seus funcionários, diretores dos colégios, juízes, funcionários dos fóruns das cidades, voluntários e colaboradores. Em 2007, o projeto Paternidade Responsável deixou de ser piloto e passou a ser uma mobilização contínua que abrange toda São Paulo. Até o dia 28 de junho desse ano, foram feitas 31.758 solicitações de indicação de suposto pai em 495 cartórios dos municípios do Estado.
Em 05 de agosto, considerado Dia da Paternidade Responsável, foi aberta a segunda etapa desse projeto. Segundo o presidente da Arpen, Dr. Antonio Guedes Netto, os cartórios de mais de 300 cidades do Estado ainda estão enviando as suas estatísticas. "É possível notar o sucesso da ação, que envolveu 1.980 escolas públicas. Dos 36.592 atendimentos, foram contabilizados 16.914 indicações de supostos pais; 8.636 audiências realizadas; 3.646 cartas enviadas para os alegados pais serem ouvidos em outros municípios ou Estados; e 3.118 encaminhamentos à Defensoria Pública/OAB para dar continuidade ao processo - seja para investigação da paternidade ou pedido de DNA. O projeto ainda possibilitou que 775 casos fossem encaminhados à adoção unilateral - quando o homem que mora com a mãe do estudante, mesmo não sendo o pai biológico, deseja registrá-lo como seu filho - e 76 mil mães indicaram o nome do suposto pai, resultando em cerca de seis mil reconhecimentos realizados de forma espontânea".
"Todos trabalharam com afinco nessa mobilização tão especial que contempla um objetivo social. É gratificante ver nos olhos daquelas crianças a esperança do reconhecimento, não só no papel, mas na vida", comemora Durvalino.
Em Sorocaba, o projeto envolveu as 5.192 crianças matriculadas na rede pública sem o nome do pai no registro e 800 dessas tiveram indicação, pelas mães, de seus supostos pais. Santo André notificou 1.005 mães e 40% já apontaram os pais para o reconhecimento. Na região de Matão, mais de 400 mães foram notificadas, sendo que 102 indicaram os supostos pais nas 92 audiências realizadas neste mês.
Todos os supostos pais intimados foram indicados pelas mães, como sendo o pai biológico de seus filhos, esclareceu Durvalino. "Na audiência lhe fora perguntado se o mesmo era ou não o pai da criança. Sendo positiva a resposta, no ato o pai assinou um termo de reconhecimento de paternidade para que, por meio de um Mandado de Averbação o Cartório de Registro Civil em que foi registrada a criança, registre a margem do termo, o nome do pai e dos respectivos avós paternos. Assim será expedido uma nova certidão com a paternidade reconhecida. Sendo negativa a resposta do suposto pai, a mãe foi encaminhada a OAB para a investigação de paternidade".
Claudinei José Pires, oficial de Registro Civil de Capão Redondo, disse que "a iniciativa serviu para abrir os olhos da sociedade para o problema, mostrando que a solução é bem mais simples do que pode parecer". Luiz Fernando Matheus, oficial do 40º Cartório Brasilândia, compartilhou essa opinião: "Sem qualquer dúvida, esse projeto mostra o real interesse do Poder Judiciário em estar cada vez mais envolvido com a sociedade. Ajudamos o 22º subdistrito - Tucuruvi, na primeira fase do projeto, onde a estimativa era de comparecimento de em torno de 300 casos, mas o atendimento ficou perto da metade desse número. Mas, por causa do o ínfimo número de procura, não participamos da segunda fase."
Pai: presença no documento e na vida do filho
Vera Lucia Anselmi Melis, diretora-executiva do Aryran Instituto de Desenvolvimento Humano, Cultura e Meio Ambiente, acredita que ter o nome do pai no documento é apenas um dos direitos que se deve garantir a toda criança. E defende que a paternidade responsável é o reflexo de muitas mulheres abandonadas quando sabem que estão grávidas. "Por isso, o sentimento de paternidade deve ser cultivado desde cedo, com as primeiras orientações sobre sexualidade. Falamos aos jovens como evitar filhos, mas muito pouco sobre o que fazer quando uma criança chega. A responsabilidade de ter um filho, cuidar e educar é de toda uma cidade, mas particularmente dos pais que, se estabelecem os vínculos, fortalecem sua participação no mundo e proporcionam dias felizes".
O projeto Paternidade Responsável é de muita relevância, avalia Dra. Esalba Maria Silveira, doutora em Serviço Social, terapeuta de Casal e Família e coordenadora do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (CEFI). Para ela, o registro civil é a primeira inscrição de cidadania de uma pessoa, porque comprova a existência daquele cidadão para aquele país, e é, ao mesmo tempo, um dever da família e um direito de todos.
Outro aspecto que chama a atenção da terapeuta na ausência do reconhecimento da paternidade são as desigualdades sociais entre o feminino e o masculino na nossa sociedade, e a desigualdade dos papéis sociais dentro da família. Dra. Esalba explicou que uma das repercussões é o número cada vez maior de famílias monoparentais, cuja manutenção dos filhos recai exclusivamente sobre a mulher. "Levanto também os aspectos simbólico-afetivos, que vão se constituindo a partir da ausência, os quais dizem respeito a uma construção social da identidade masculina pautada pela omissão e pela vulnerabilidade. Além dessa ausência, representa também uma perda: os pais perdem muito quando não assumem a paternidade, embora muitos não tenham a consciência disso".
Ela ressalta que a identidade da criança é afetada com todo esse processo de reconhecimento ou não de sua paternidade. E a família brasileira não difere muito da própria realidade brasileira. Para Dra. Esalba, a família está em permanente processo de transformação e crescimento, revisando seus conceitos e papéis. "Há o dilema constante da manutenção de valores éticos. Por outro lado, existe a sedução de encurtar os caminhos para chegar ao seu destino. Tenho muita esperança na família brasileira, que tem se mostrado muito competente e flexível frente aos descaminhos políticos da nossa sociedade", conclui. (Luciene Correia)