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Artigo - Novas atribuições do RCPN: Um avanço na desjudicialização
Por Fernanda Maria Alves
Gomes
Inovações legislativas
ampliam a atuação dos cartórios de RCPN, fortalecendo a desjudicialização e
facilitando o acesso a direitos nas áreas mais remotas.
A criação dos ofícios da
cidadania pela lei 13.484/17 e sua declaração de constitucionalidade pelo STF1,
destacou a relevância dos cartórios de RCPNs - Registro Civil de Pessoas
Naturais na vida dos brasileiros. A possibilidade de firmar convênios para ampliar
o acesso dos cidadãos aos serviços públicos abriu novas frentes de atuação e
evidencia a confiança na qualificação técnica e na seriedade do trabalho
prestado pelos oficiais.
Posteriormente, a lei
13.846/19 autorizou a solicitação de benefícios previdenciários junto aos
cartórios para encaminhamento ao INSS - Instituto Nacional do Serviço Social. E
mais recente, com a inclusão do art. 94-A na lei 6.015/73, surgiu um novo instrumento
jurídico: o termo declaratório de união estável lavrado diretamente nos RCPNs.
É perceptível o movimento
do Poder Judiciário em direção à desjudicialização e o incentivo do legislador
federal para que essa ideia se concretize pela atuação dos mais de 7.0002
ofícios da cidadania, em especial os localizados nos distritos mais longínquos.
Atentos a essa realidade,
a comissão de juristas incluiu na proposta de reformulação do CC, novos atos a
serem praticados extrajudicialmente, como o divórcio sem partilha3, a adoção de
pessoa maior de 18 anos4, a decisão apoiada5 e o termo declaratório de
parentalidade6.
Por outro lado, houve
retrocesso ao exigir sentença judicial para reconhecimento de filiação
socioafetiva para menores de 18 anos, bem como a previsão de escritura quanto
aos maiores de idade, na medida em que o procedimento atual é ágil e econômico
para as partes, pois é feito por requerimento direto no cartório para os
maiores de 12 anos, sem necessidade da lavratura de instrumento público7.
Grande inovação da
reforma do Livro do Direito de Família é a previsão de que o cônjuge ou o
convivente, assistidos por advogado ou defensor público, poderão requerer
unilateralmente o divórcio ou a dissolução da união estável diretamente no
cartório de registro civil.
O procedimento
extrajudicial prevê a notificação prévia e pessoal do cônjuge para conhecimento
do pedido, sendo dispensada se o casal estiver presente ou manifestou ciência
por qualquer meio. Na hipótese de não ser encontrado, será publicado edital.
Após a notificação pessoal ou editalícia, o oficial procederá, em cinco dias, a
averbação do divórcio ou da dissolução da união estável.
Em havendo cláusula
relativa à alteração do nome, após a averbação do divórcio no assento de
casamento será providenciada essa anotação no nascimento. Nenhuma outra
pretensão poderá ser cumulada ao pedido, especialmente, quanto a alimentos,
partilha de bens, guarda de filhos ou qualquer outra medida protetiva ou
acautelatória.
Sensacional a
possibilidade de se formalizar o divórcio diretamente no RCPN que em seguida
fará a averbação, privilegiando-se a celeridade e o interesse dos cônjuges.
Outra novidade é a adoção
de pessoa capaz e maior de 18 anos perante o oficial de registro da residência
do adotando. O procedimento extrajudicial prevê oitiva das partes para
identificar a legitimidade da intenção e a concordância dos genitores que constam
do assento de nascimento. É uma modificação significativa considerando que
atualmente depende de sentença constitutiva.8
Também a tomada de
decisão apoiada poderá ser realizada no cartório, sendo o procedimento pelo
qual o indivíduo capaz, mas com alguma limitação física, sensorial ou psíquica,
ou declarado relativamente incapaz na forma do inciso II do art. 4º, que tenha dificuldade
para a prática de atos da vida civil, elege pessoas ido^neas, com as quais
tenha vínculos e confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão.
Para formalizar o ato, o
solicitante e os apoiadores devem apresentar requerimento em que constem os
limites do apoio e os compromissos dos apoiadores, o prazo de vigência do
acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que devam
apoiar. A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos quanto a
terceiros. O Ministério Público verificará a adequação do pedido aos requisitos
legais. Antes de se pronunciar sobre o pedido, o registrador civil, assistido
por equipe multidisciplinar e após oitiva do Ministério Público, ouvirá
pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio. Em caso de
dúvidas sobre a viabilidade, o oficial poderá negar e remeter as partes para o
âmbito judicial. A pessoa com deficiência pode, a qualquer tempo, revogar a
tomada de decisão apoiada, mediante requerimento junto ao RCPN, preservados os
efeitos jurídicos já produzidos.
Por fim, o termo
declaratório de família parental será averbado no registro de nascimento, por
vontade expressa do interessado. A família parental é a composta por, pelo
menos, um ascendente e seu descendente, qualquer que seja a natureza da
filiação, bem como a que resulta do convívio entre parentes colaterais que
compartilham o lar, responsabilidades familiares, pessoais e patrimoniais. Para
a preservação dos direitos atinentes à formação da família parental, é
facultado que declararem, em conjunto, a assunção da corresponsabilidade e
postulem a averbação nos respectivos assentos, sem que lhes altere o estado
familiar. A família parental cria obrigações comuns e recíprocas de suporte, de
sobrevivência e de sustento dos que dividem fraternalmente a mesma moradia.
Note-se a conveniência e
praticidade de se formalizar esses atos jurídicos diretamente nos RCPNs, onde
serão averbados nos assentos civis para que tenham eficácia. Nada mais
coerente, rápido e econômico do que se deslocar até um cartório, manifestar sua
vontade e já receber a certidão atualizada em mãos.
As inovações propostas
valorizam e ampliam as atribuições dos ofícios da cidadania, contribuindo para
sua auto sustentabilidade e promovendo a desjudicialização, com o bônus de
permitir o acesso à justiça nas comunidades mais distantes.
1 ADIN 5855.
2 https://transparencia.registrocivil.org.br/cartorios
3 Proposta do novo
CC Art. 1.582-A.
4 Proposta do novo
CC Art. 1.619.
5 Proposta do novo
CC Art. 1.783-A. e Art. 1.783-B.
6 Proposta do novo
CC Art. 9º Serão registrados ou averbados no Cartório de Registro Civil das
Pessoas Naturais: X - da escritura pública e termo declaratório públicos
de declaração de família parental, nos termos do § 2º do art. 1.511-B e nos
limites do § 1º do art. 10, ambos deste Código.
7 Proposta do novo
CC Art. 9º Serão registrados ou averbados no Cartório de Registro Civil das
Pessoas Naturais: VIII - a sentença que reconhecer a filiação
socioafetiva ou a adoção de crianças e de adolescentes e a escritura pública ou
a declaração direta em cartório que reconhecer a filiação socioafetiva ou a
adoção; § 2º O reconhecimento de filiação socioafetiva de pessoa com
menos de dezoito anos de idade será necessariamente feito por sentença judicial
e levado a registro, nos termos deste Código."
8 Art. 1.619 do CC.
Fonte: Migalhas