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02 de Dezembro de 2020

Artigo - História de pacto antenupcial. Mais uma! - por Marco Antonio de Oliveira Camargo

Não existe tabelião de notas ou profissional de direito que não enfrente ou tenha enfrentado dificuldades com Escrituras de Pacto Antenupcial (tabelião sofre com isso!!!).

Para o necessário registo do Pacto Antenupcial em seu cartório, um colega registrador imobiliário, sempre exige requerimento formal de ambos os contraentes (com reconhecimento de firma ou assinatura presencial, de ambos, diante de seu preposto), ou seja, ele como norma de conduta, sempre ignora solenemente a declaração das partes que consta da escritura, indicando expressamente o primeiro domicílio do casal e autorizando-o à pratica de todos os atos necessários à eficácia e publicidade daquela convenção.

A justificativa para a recusa estaria no fato que, no passado, houve decisão de dúvida sobre a registrabilidade de uma escritura de pacto antenupcial, tendo sido prolatada Sentença do Corregedor Permanente da qual se extrai a seguinte orientação:

“… De fato, na medida em que a convenção antenupcial antecede o casamento, a declaração do futuro domicílio é apenas uma exteriorização de intenção, que pode ou não se concretizar. Aliás se o Registrador de G****, registrou a convenção antenupcial, presume-se, por força do artigo 1657 do Código Civil e artigo 244 da Lei nº 6015/73, que as partes fixaram seu domicílio conjugal na circunscrição territorial daquela unidade mineira, o que contraria as declarações dos cônjuges de que teriam fixado seu primeiro domicílio na cidade de P***...”

A dúvida, corretamente julgada procedente, sabiamente obstou a realização de um segundo registro da mesma escritura de pacto antenupcial.

Naquele caso particular, por motivo ignorado, as partes solicitaram o registro de sua escritura de pacto antenupcial em uma cidade do Estado de Minas Gerais e posteriormente vieram a solicitar a realização de um segundo registro da mesma convenção em um dos Registros Imobiliários da Comarca de Campinas, sob a pretensa alegação de que na escritura lavrada pelo tabelião, consta que o primeiro domicílio do casal haveria de ser fixado em área territorial integrante daquela circunscrição imobiliária.

Então, qual o problema, Tabelião?

A interpretação do decidido é o problema desde tabelião e de muitos usuários daquele registro.

O escrevente encarregado da qualificação de uma escritura de Pacto Antenupcial lavrada recentemente, ao ser questionado sobre a desnecessidade de repetir a mesma solicitação formal – que já expressamente consta da escritura pública lavrada – para realizar o registro naquele cartório, por e-mail, assim manifestou-se:

“…. Especificamente em relação ao tema abordado, temos precedente do nosso Juiz Corregedor Permanente que impossibilitou o registro (Processo nº ……)”

“Na decisão mencionada, consta que não devemos aceitar a declaração contida na escritura, por isso foi solicitada a declaração dos nubentes.”

O raro (e paciente) leitor deve ter estranhado a interpretação feita do decidido. Ora, é evidente que o Corregedor não disse que o registrador não deve aceitar a declaração contida na escritura.

Certamente não é isso que foi decido pelo juiz corregedor.

Em sua sábia decisão o Juiz Corregedor acertadamente vedou a realização de um segundo registro da mesma escritura de pacto antenupcial. Mas, evidentemente, em nenhum momento proibiu, vedou, desaconselhou ou determinou como sendo irrelevante e desnecessário constar na Escritura de Pacto Antenupcial a eleição do primeiro domicílio do casal.

A interpretação que se deve fazer do decidido, em perfeita consonância com todo arcabouço jurídico existente, é muito simples: o declarado na escritura deve ser considerado, em princípio, como a correta manifestação de vontade das partes que pretendem se casar em data futura. Entretanto, na medida em que a plena liberdade de escolha é garantida constitucionalmente a todos, a livre escolha sobre o domicílio do casal, como liberdade plena que é, deve ser respeitada integralmente por todos os demais e pelos agentes públicos em geral.

Ela – escolha do domicílio – não pode ser limitada por uma declaração anterior e, por tal motivo, é lícito aos contraentes alterar a escolha alhures realizada.

A mudança da escolha do domicílio do casal é um direito que deve ser preservado e o declarado na escritura de pacto antenupcial não obriga ninguém a necessariamente fixar seu domicílio em determinada localidade.

O registro da escritura de pacto antenupcial no registro de imóveis do primeiro domicílio conjugal, entretanto, é obrigação a todos imposta.
Ao registrador daquela circunscrição cabe qualificar o título com vistas à segurança jurídica e isso somente pode ser garantido com uma postura proativa, favorável, facilitadora das obrigações por lei imposta a todos.

É muito importante e eficaz fazer constar na escritura pública de pacto antenupcial a eleição do primeiro domicílio do casal. A declaração de que existia a intenção de fixação do primeiro domicílio conjugal em tal ou qual circunscrição não deve ser desconsiderada se o pacto antenupcial é recente e se ele é apresentado ao oficial de registro de imóveis escolhido como competente para o seu registro e que é provocado à fazê-lo com a apresentação da própria escritura para registro.

Está equivocado o entendimento do registrador imobiliário. Foi solicitada a mudança de sua postura e, espera-se, ela deverá acontecer em breve.

Se não por iniciativa dele próprio, por nova suscitação de dúvida a seu Juiz Corregedor Permanente.

DIFICULDADES DE TODO PACTO ANTENUPCIAL

Pode parecer banal, mas, de fato na prática cotidiana das notas e do registro o Pacto Antenupcial representa um grande problema na medida em que os usuários do serviço público, em sua esmagadora maioria, não compreendem a razão, o motivo e a inteligência da disposição legal que obriga o registro de escritura de Pacto Antenupcial em Cartório de Registro de Imóveis.

Não por outro motivo, em todas as escrituras de Pacto Antenupcial, fazemos constar as seguintes informações e declarações:

“….. DO PRIMEIRO DOMICILIO DO CASAL: Pelos outorgantes e reciprocamente outorgados, me foi dito, falando cada um por sua vez, que estão de pleno e inteiro acordo com a presente escritura e seus efeitos, declarando ainda estarem cientes do disposto no artigo 1657 Código Civil Brasileiro (art. 1657. As convenções antenupciais não terão efeitos perante terceiros senão depois de registradas, em livro especial, pelo oficial do Registro de Imóveis do domicílio dos cônjuges), esclarecendo ainda que o primeiro domicílio do casal será nesta cidade e comarca de Campinas – SP, no endereço acima indicado …… (em área territorial integrante da X Circunscrição Imobiliária desta Comarca). DO REGISTRO DESTA ESCRITURA: Por eles me foi dito ainda que, desde já, expressamente autorizam o Xº Oficial de Registro de Imóveis desta Comarca de Campinas, comprovada a realização de seu casamento civil e mediante a apresentação desta escritura, a proceder a todos os registros e averbações necessárias à eficácia e publicidade da presente convenção e o integral cumprimento do dispositivo legal acima referido.”

Mesmo com todo este cuidado é comum o tabeliao se deparar com a situação de ausência de registro do Pacto Antenupcial.

Perguntado sobre o registro daquele pacto, o pretendente à aquisição (ou alienação de um imóvel) responde ao tabelião com a afirmação que representa uma impossibilidade jurídica: O meu pacto está registrado aí no seu cartório !

Responde o tabelião que efetivamente a escritura foi lavrada naquele tabelionato mas que ele não tem competência para registrá-la. E que o registro daquela escritura somente poderia ter sido feito após a celebração do casamento.

Retruca então o usuário: “Mas foi neste cartório que eu casei !” (existe de fato a acumulação entre os serviços notariais e de registro civil, no cartório onde atua este tabelião e em muitos cartórios do país).

A tarefa fica um pouco mais difícil. Torna-se preciso explicar para o incrédulo cidadão que o registro necessário não tem relação com o Registro Civil das Pessoas Naturais e que, ele recém-casado, após o término de sua licença e lua-de-mel, deveria obrigatoriamente ter se dirigido ao Cartório de Registro de Imóveis da Comarca para lá noticiar que decidiu-se pelo casamento com regime de bens diferente do sugerido pela lei e, comprovando a realização de seu casamento, registrar aquela escritura lavrada no tabelionato e, se existente algum registro de propriedade, ver realizada na matrícula daquele bem a atualização dos dados de sua qualificação pessoal.

Assim cientificado, perplexo, o cidadão responde platitudes: eu não sabia disso … ninguém me disse nada ….

Pronto! Mais um problema para o tabelião tentar solucionar (por isso o lamento do início deste texto).

**Marco Antonio de Oliveira Camargo é Tabelião de Notas e Oficial de Registro Civil em Campinas - Distrito de Sousas.

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